O ano era 1982. Frank Miller,
agora um desenhista em ascensão, havia acabado de deixar o título do Demolidor
onde havia permanecido durante quatro anos, e buscava novos ares e novos
desafios. A proposta para a criação de uma história envolvendo o mutante
canadense membro dos X-Men partiu de Chris Claremont, escritor que havia
desenvolvido (com John Byrne) uma das mais famosas histórias dos Filhos do
Átomo, a Saga da Fênix Negra.
Nessa mesma história, o Wolverine
havia ganhado uma relevância dentro da equipe sem precedentes ao detonar
praticamente sozinho todo o Clube do Inferno na tentativa de resgatar os X-Men
das garras do clã maligno, e é claro que ele estava ganhando cada vez mais
popularidade. Segundo o próprio Claremont, era hora do baixinho invocado ganhar
uma minissérie só dele, e a quatro mãos começou a rascunhar o argumento para a
história sobre a viagem do Carcajú ao Japão.
A princípio relutante em colocar
suas mãos no personagem de ossos de adamantium, Frank Miller só se convenceu
quando percebeu que podia usar na história elementos que ele gostava de lidar,
como ninjas, espadas e tudo que envolve a cultura oriental (coisa que ele já
havia aprendido a trabalhar com o Demolidor e a Elektra), e foi aí que surgiu
um dos mais memoráveis arcos da carreira do Wolverine até hoje. E olhe que lá
se foram trinta e poucos anos de lá pra cá!
Claremont criou um enredo de
início simplista, mas que vai se intricando ao longo da história. Nele, Logan
decide ir até o Japão quando não consegue contato à distância com uma antiga namorada
chamada Mariko Yashida, e contando com o auxílio de um velho amigo nipônico
chamado Asano Kimura, o mutante descobre que Mariko está casada com um
importante figurão local e que ela está honrando um pedido pessoal de seu pai,
que é o homem mais poderoso do país.
Intrigado com aquela história, Logan
visita Mariko e descobre que a moça está sendo espancada pelo marido, o que o
leva a confrontar diretamente o pai da moça, o Mestre Shingen. Shingen desafia
Logan a um combate com bokan, as espadas samurais de madeira usadas para
treino, e após ser atingido por shurikens ninjas banhados com um poderoso
veneno, o herói mutante acaba conhecendo o gosto da derrota pelas mãos do velho
samurai e é desonrado diante dos olhos de Mariko.
A partir daí, uma jovem conhecida
de Shingen chamada Yukio atravessa o caminho do combalido Wolverine, e juntos
eles começam a percorrer as ruas do Japão em busca de aventuras, enquanto o
fator de cura mutante de Logan vai recuperando seu sistema nervoso
gradativamente do veneno que fez com que ele fosse vencido por Shingen.
Enquanto
Shingen continua seus planos de dominar todo o submundo criminoso, ele planeja
usar Yukio para destruir de vez as pretensões do mutante para com sua filha, e
o enredo gira em torno dessa vingança e da medição de força entre ambos até a
conclusão do arco.
Para a galera da nova geração
deve ser um choque ver o Wolverine, o herói mais casca-grossa das HQs, sendo
derrotado por um velhinho empunhando uma espada de madeira, mas é importante
lembrar que no contexto da narração (trinta anos atrás!) o Carcajú ainda não
era esse guerreiro imortal dos dias atuais que se recupera em minutos de
explosões nucleares e de banhos de ácido. Apesar de já possuir seu fator de
cura, que como ele mesmo cita na história o ajudou a se livrar de diversas
enrascadas, esse seu poder mutante era bem menos poderoso na época e foi assim
que aprendemos a conhecer o personagem; alguém extremamente habilidoso e durão
só que com limitações. Hoje em dia o cara enfrenta personagens como Ragnarok (o
clone do Thor criado na Guerra Civil) e o Quinteto Fênix (Vingadores Vs. X-Men)
com certa naturalidade, e mesmo quando é completamente deteriorado, ele só
precisa esperar "algumas páginas" da mesma revista para se recuperar
completamente, o que diminuiu e muito a graça do personagem.
Alguém consegue
imaginar hoje o Wolverine sendo fulminado por uma rajada de uma Sentinela e
morrendo, como acontece em Dias de um Futuro Esquecido?
Eu, Wolverine possui muito a cara
de Frank Miller apesar do argumento cheio de balões e textos gigantes como é
característico do trabalho de Chris Claremont, e as cenas de ação são seu
grande forte. Diferente do clima “romântico” dos anos 60, e das bizarrices dos
anos 70 nos quadrinhos, os anos 80 mostravam uma violência mais explícita em
suas páginas, e nessa primeira aventura solo do Wolverine já vemos sua frase
clássica sendo levada a sério: “Eu sou o melhor no que faço, e o que eu faço
não é bonito”. Realmente o baixinho canadense não alivia para os adversários, e
em alguns quadros vemos literalmente o sangue jorrando, mesmo dos ninjas do
Tentáculo que costumam evaporar quando morrem.
Em grande parte da história vemos
um Wolverine enfraquecido pelos efeitos do veneno que lhe é aplicado através de
shurikens, e isso é utilizado como desculpa para a forma como ele apanha feio e
não mostra o tempo todo do que é capaz. É interessante notar, no entanto, que
isso não faz com que torçamos menos por ele, e que mesmo avariado, o cara ainda
é o melhor no que faz. Apesar da lentidão do enredo e da variação irritante no
traço de Miller, que ora beira a excelência e outra beira o relaxo, Eu, Wolverine possui pontos altos muito fortes como a luta final entre Logan e
Shingen que fazem valer cada centavo gasto pelo encadernado.
O Frank Miller que vemos aqui
ainda é um cara que aprecia o que faz, e apesar das minhas críticas a seu traço
que por vezes parecem bem irregulares, ele está em seu grande momento. Sempre curti
os desenhos do cara nas histórias do Demolidor e foi com o passar do tempo que
ele foi assumindo seu traço “quadrado” mais característico visto em o Cavaleiro
das Trevas de 1986. Até chegar a seu trabalho mais expressivo, Miller ainda
escreveu A Queda de Murdock (também de 1986) que a meu ver é a história
definitiva do Homem Sem Medo da Marvel. Gabarito Miller tem e MUITO para ser
lembrado como um dos artistas mais competentes da história dos quadrinhos,
mesmo ele tendo ficado meio gagá com o avanço da idade. E não, nem vou citar
aqui O Cavaleiro das trevas 2, ou eu seria obrigado a retirar todos os elogios
feitos a Frank Miller!
Eu, Wolverine foi usado como linha
base para a construção do roteiro de Wolverine Imortal lançado em 2013 nos
cinemas, e apesar das diversas alterações de roteiro como a presença da Víbora
e do Samurai de Prata, ainda é possível reconhecer algumas características como
a presença de Mariko Yashida, Yukio e até mesmo a batalha contra Shingen, no
filme vivido pelo ator Hiroyuki Sanada (o Dogen da 6ª Temporada de LOST), que lembra bastante a dos quadrinhos.
O encadernado de Eu, Wolverine
foi lançado no Brasil pela Panini em 2006, e além da história original em
quatro capítulos, apresenta também o Casamento de Wolverine com Mariko,
história que conta com a participação dos X-Men, da Víbora (a Madame Hidra) e
do Samurai de Prata que querem estragar a festa. O enredo é enrolado e confuso
e termina de forma cretina, o que não chega a desvalorizar a edição cuidadosa da
Panini que conta ainda com uma introdução escrita pelo próprio Chris Claremont
que conta como convenceu Frank Miller a desenhar Eu, Wolverine.
Vale a pena pra quem quer saber
como o filme Wolverine Imortal poderia ter sido beeeem melhor.
NOTA: 8
NAMASTE!
EU TENHO ... A MAIORIA DE VOCÊS NÃO TEM
ResponderExcluirEu ia dizer "eu teeeenho, você não teeem" ... mas outros aficionados como eu diriam que estou errado.
Mas, pelo menos eu (e alguns poucos mestres do universo) temos, kkk...
Sério agora, quem nunca leu, procura uma versão digital, tá cheio na internet, vale o download.
Li essa revista há pouco e ela é muito boa, e ao mesmo tempo simples. O filme teria sido bem melhor com aquelas cenas de ação, mas nesse contexto da HQ. Li e tenho a versão original da Abril de 1987(comprei usada).
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