Será que os cães vão para o Paraíso?
Hoje eu perdi o meu melhor amigo e não há nada que eu
escreva aqui que vá confortar meu coração. Ele vinha há alguns anos lutando
contra um câncer que o estava debilitando bastante, comprometendo ainda mais a sua já cansada forma física. O Peter tinha 15 anos, estava na família há
bastante tempo e é difícil descrever a falta que já está me fazendo.
Eu o adotei quando ele tinha alguns meses de vida. Uma
colega de trabalho tinha dito que ele e seus irmãozinhos estavam sendo doados
por vizinhos, o que me fez pensar em ter uma companhia canina. Nós já tínhamos
tido alguns cães em nossa casa durante a minha infância, mas na época, acabei
não tendo muita ligação emocional com eles. O Peter foi o meu primeiro cachorro
de certa maneira. Por alguma razão, eu sempre quis ter um animalzinho em casa —
além dos infinitos gatos de minha mãe que iam e vinham — e minha conexão com
aquele vira-lata de pelo branco foi imediata.
Não tem jeito. Por mais que a gente queira se preparar para
o momento da despedida, nada é capaz de nos acalentar quando a hora da
separação chega. Eu estou escrevendo esse texto poucas horas depois de dar o
último adeus ao meu amigo, por isso, espero que quem esteja lendo isso me
perdoe pelas incoerências e erros gramaticais.
Por conta da doença, nos últimos meses o Peter vinha
sofrendo algumas convulsões que paralisavam suas patas traseiras e o deixava
ofegante. Nada era mais doloroso do que vê-lo sofrer sem poder fazer nada. Eu
costumava ficar com ele quando essas convulsões aconteciam, não porque eu
achava que o pudesse ajudar, mas para confortá-lo, fazê-lo se sentir seguro,
talvez feliz por ter companhia na hora da dor. Eu não sei. Queria ter podido
fazer mais.
Eu tenho muita dificuldade para lidar com a morte e sempre
tentei adiar o máximo possível falar disso no âmbito familiar. Eu chorava só de
pensar em ter que me despedir do meu amigo e agora que o momento chegou, eu mal
consigo acreditar que não vou mais vê-lo, que ele não vai mais estar na sua
casinha, que ele não vai mais andar até mim quando me ver chegar da rua. Os
anos o deixaram mais lento, mais frágil, mas sempre era bom ser recepcionado
com aquele balançar de cauda, aquele olhar de felicidade ao me ver. Cara! Não
deve ter nada no mundo que se compare a isso!
Eu
tenho diversas boas memórias do Peter nesses 15 anos e uma delas é vê-lo jovem
e saudável correndo atrás de uma bola brincando comigo e com meu sobrinho
Michael no quintal de casa. O “Pete” — Píti —, como a gente o chamava, era aquele filhote
do tipo “elétrico” que não conseguia parar quieto no lugar, sempre brincalhão e
alegre. Pulava nas nossas pernas dando aquele “coice” com as patas traseiras e
quando agarrava alguma coisa com os dentes afiados, não queria mais largar. Eu demorei
a perceber que os anos tinham passado e não saberia dizer quando foi que ele
parou de ser tão agitado, assumindo então sua velhice.
Uma
das minhas melhores memórias com o Peter foi na época no fim do meu primeiro
grande relacionamento amoroso, que na época, me deixou muito mal. Eu não era de
demonstrações públicas de sofrimento, por isso, me escondi numa das duas casas
do quintal da minha mãe e me sentei lá para chorar as dores do amor perdido. Como eu
disse antes, o Peter sempre foi um bicho muito animado e bagunceiro, ele jamais
chegaria perto de mim sem pular em cima ou latir primeiro, mas naquele dia,
como que respeitando a minha tristeza — e eu estava em lágrimas por causa do
fim do namoro — o Peter chegou próximo de mim, me viu ali sentado e
simplesmente se deitou ao meu lado, calmamente, silenciosamente, como ele nunca
tinha feito. Aquela foi a maior demonstração de amizade que eu havia recebido
na vida e depois daquilo, passei a entender que os cães eram com segurança as
criaturas mais amáveis da face da Terra. Eu amava o Peter.
Depois
que eu comecei a trabalhar diariamente com raríssimos intervalos de férias,
feriados e fins de semana, eu meio que parei de acompanhar a evolução daquele meu
cachorro antes feliz e saudável para o velhinho doente, mas todas as vezes que eu
chegava em frente ao portão, ainda era muito bom ver aqueles olhos brilhando em
minha direção, dele sobressaltando de onde quer que estivesse para me
recepcionar com alegria. Não importava o quão ruim tinha sido o meu dia, tudo
passava quando eu acariciava aqueles pelos brancos e fazia um cafuné na cabeça
daquele vira-lata. Por anos, o Peter era a única constante em minha vida. Mesmo
triste, cabisbaixo, infeliz, zangado ou simplesmente de saco cheio da vida,
aquele cachorro ainda me tirava um sorriso e me fazia falar com aquela “vozinha”
que todo mundo faz quando se dirige ao seu pet.
Eu me
acostumei durante os últimos meses a ir para a sala assistir algum filme ou
série e preparar algum sanduíche ou algo rápido antes para comer na cozinha — rotina quase certa
durante a pandemia —, e essa era a hora que ele sempre aparecia na porta, como
quem dissesse “ei, amigão, tem algo aí pra mim? ”. Era eu acender a luz para
ele colocar a cabeça na porta e eu o dar algum mimo, em especial aqueles
biscoitos para cães que ele adorava. Mesmo já não tão ágil e nem com tanta firmeza
no maxilar, ele pegava o biscoito com o máximo de delicadeza e saía para
mastigar, já se preparando para vir buscar outro. Parece uma coisa simples, mas
até disso eu venho sentindo saudades. É uma dor que parece que não vai embora
nunca. O último pacote de biscoitos ficou no armário, ainda pela metade.
Essa
noite eu fui dormir querendo sonhar com o Peter, para poder me despedir melhor
dele, para lhe dar o abraço que eu não dei e tudo que espero para os próximos dias é que eu sinta a presença do meu tão
querido amigo nem que seja só para me dar um “oi”. Eu tenho estado
muito isolado, solitário nesses meses de pandemia e eu sentia que o Peter era
minha última conexão com o mundo. Enquanto as lágrimas rolam em meu rosto nesse
momento, rogo para que, se é que esse lugar existe, o meu cachorro tenha um
lugar especial no Paraíso, e que ele seja bem tratado lá, correndo feliz entre
as nuvens e pulando nas pessoas com sua energia inesgotável.
Descanse
em paz, amigão. Espero te ver novamente um dia!
NAMASTE!
Linda homenagem. Tenho um pet tb...
ResponderExcluirObrigado pelo carinho!
ExcluirCuide desse pet aí e viva intensamente ao lado dele!