EPISÓDIO 2 - MUTANT LIBERATION BEGINS
O segundo episódio de X-Men ‘97 começa mostrando que a confiança em Charles Xavier de deixar a mansão X e os X-Men sob a sua tutela girou uma chave na cabeça do Magneto. Logo após surgir diante dos alunos do professor, Magnus resolve deixar de lado a sua cruzada violenta contra os humanos e começa a praticar boas ações pela cidade, inclusive, salvando a vida daqueles que o temem. Tais atos chamam bastante a atenção da imprensa e do governo, colocando-o em evidência.
Na mansão, o clima continua tenso com a aparente mudança de comportamento daquele que sempre foi o seu maior inimigo, e os mutantes não parecem confiar em Magneto totalmente, com exceção da Vampira, que sai em defesa dele (mais pra frente entendemos porquê!).
Em paralelo às desconfianças do Ciclope, da Tempestade e do Wolverine, Magnus decide salvar os Morlocks no subsolo da cidade. Lá embaixo, os protegidos da mutante Callisto estão sob a ameaça dos Amigos da Humanidade e o seu material bélico das Sentinelas, mas quando parece mesmo que os mutantes excluídos vão ser assassinados, Magneto surge para salvá-los e dar uma lição nos supremacistas.
De volta à mansão, Magneto levanta a questão de por que Xavier e os X-Men nunca pensaram em abrigar os Morlocks ou lhes dar uma chance mais digna de sobrevivência em alternativa aos esgotos onde eles moram. Afinal, o sonho do professor não era o de convivência pacífica entre mutantes e humanos? Como isso é possível se eles próprios excluem os seus pares?
Magneto, então, informa que os Morlocks estão sendo encaminhados para a nação de Genosha. Após livrar a ilha dos antigos déspotas que a usavam como campo de concentração mutante — isso chegou a ser mostrado ainda na primeira temporada da animação —, o Magneto decidiu tornar o lugar um porto seguro para os seus iguais, algo com a qual Xavier jamais concordou por pensar que seria um meio de segregar os mutantes, em vez de simplesmente protegê-los.
Aliás, criar um santuário onde os mutantes possam viver livremente sem a ameaça dos humanos sempre foi uma ideia que permeou a mente de Magneto e, duas temporadas antes, ele mesmo já havia tentado fazer isso com o Asteroide M, um enorme corpo celeste em órbita da Terra para onde ele pretendia levar não só os seus aliados — os Acólitos — como também o próprio Charles Xavier.
Após o discurso de Magneto de manter os mutantes seguros em uma ilha, Jean e Ororo iniciam uma conversa particular no quarto. Lá, a ruiva confessa à amiga temer pelo futuro de seu vindouro filho caso ele também seja um mutante, e diz que pressente algo maligno a se aproximar desde que sondou a mente de Henry Gyrich para descobrir o paradeiro de Bolivar Trask.
Ainda durante esse diálogo, a Tempestade pergunta à Jean se ela deseja que a criança em sua barriga nasça humana e, logo depois, ela mesma confessa que já se imaginou sendo somente uma humana comum, e o quanto isso teria tirado de sua vida. Ororo diz que se não fosse uma mutante, ela jamais teria chegado à mansão ou conhecido a sua melhor amiga.
Aqui, vale mencionar que essa amizade entre elas citada por Ororo nunca foi tão bem delineada nas temporadas anteriores de X-Men, mas que era algo muito explorado nas HQs, principalmente, na fase escrita pelo Chris Claremont. A Tempestade se sentia muito solitária sendo a única mulher no grupo — na segunda formação dos Filhos do Átomo, quando todos os X-Men originais haviam deixado a mansão, com exceção do Ciclope —, e só quando a Jean retornou é que ela pode contar com alguém que pudesse não só confiar como também se inspirar.
Para completar o climão de novela das oito sempre presente em X-Men — pelo menos nas adaptações que valem —, a Vampira decide fazer uma visitinha ao escritório do Magneto dentro da mansão e, num diálogo bastante revelador entre os dois, é insinuado que eles tiveram um “trêlêlê” no passado, algo que nunca antes foi sequer sugerido em outras temporadas do desenho.
Enquanto a gente se pergunta quando isso teria acontecido, várias teorias vão se formando, até que a verdade finalmente seja revelada.
Nas HQs, é público que em mais de uma situação o Magneto e a Vampira já se pegaram fortemente, e a fase mais conhecida deles como um casal ocorreu quando os dois ficaram perdidos na Terra Selvagem e ela se viu privada de seus poderes de absorção.
Aí, já sabe, né… calorzão, gente suada andando com pouca roupa pra lá e pra cá… Me Tarzan, you Jane…
Aliás, quem não se lembra daquela clássica capa desenhada pelo Jim Lee em que os dois aparecem posando altamente gostosos e sensuais, hein?
No Brasil, isso foi publicado pela primeira vez em 1994, na revista dos X-Men nº 71 da Editora Abril. Tenho até hoje esse formatinho!
Na animação, no entanto, o clima entre a Vampira e o Magneto esfria quando Valerie Cooper aparece no gramado da mansão com helicópteros e soldados armados no intuito de levar o Mestre do Magnetismo a julgamento por seus antigos crimes. Na cronologia do desenho, vale ressaltar que não havia nem um ano, o Magneto estava se preparando para organizar uma coalizão contra a humanidade no momento em que ele decide abandonar tudo a pedido de um moribundo Charles Xavier.
Como representante da ONU, a doutora Cooper garante que Magneto será ouvido na corte e que terá direito de se defender perante os juízes, o que faz, então, com que ele se renda e aceite partir com os soldados sob custódia.
Na animação, o Magneto está usando o EXATO uniforme que ele adota quando assume a liderança dos X-Men a pedido de Xavier nas HQs, abandonando, inclusive, o elmo de balde. O gibi, cuja capa clássica mostra ele algemado em primeiro plano enquanto os mutantes caem na porrada com os irmãos Strucker na parte de trás da cena, foi a primeira HQ que eu li dos X-Men na vida (a X-Men nº 24 da Editora Abril de 1991).
A animação usa muito bem essas referências canônicas, mas é claro que, mesmo os roteiristas respeitando o material original, teve nerdolinha reclamando na internet que “aiiiinnn, o meu Magneto está parecendo uma Drag Queen com essa roupa cafona!”
Como prometido por Valerie Cooper, os representantes da ONU ouvem o que Magneto tem a dizer em sua defesa, depois que eles o acusam de todos os crimes cometidos ao longo de sua carreira como “terrorista mutante”. Um clima muito hostil se forma no entorno da sede da ONU, quando manifestantes pró-humanidade ameaçam invadir o local para fazer justiça com as próprias mãos. Exatamente por conta disso, alguns dos X-Men decidem comparecer à seção e fazer a defesa não só do Magneto — que está algemado e com um colar inibidor de poderes no pescoço —, mas também de todas as pessoas ali presentes.
Perante os juízes, Magneto faz um discurso bastante inflamado, porém, consciente do papel que ele representa ali como um libertador mutante.
“Quando criança, os lares do meu povo foram reduzidos a cinzas porque ousamos chamar Deus por outro nome. Então, o meu povo me caçou como aqueles que os haviam caçado. Eu era uma aberração. Nascer mutante era abominável aos olhos de qualquer deus. Existe um refrão na triste canção da história: ‘Pense diferente, ame diferente, tenha o sexo ou a pele diferente e será punido’. Nós cantamos essa canção um para o outro, os oprimidos se tornam opressores. O Xavier sabia disso e sonhava que poderíamos mudar, encontrar harmonia, um futuro onde humanos e mutantes pudessem superar o passado…”
Um roteiro desse calibre jamais poderia ser escrito no passado, quando as primeiras temporadas do desenho foram ao ar para um público mais jovem. Depois de ouvi-lo, seja na versão em inglês ou a dublada pelo Charles Dalla, é bem difícil não estampar uma camiseta com os dizeres "Magneto Is Right" e sair com ela por aí!
Do lado de fora, enquanto o julgamento se estende e os manifestantes enfurecidos tentam furar as defesas da polícia local, os Amigos da Humanidade mostram que têm um plano maligno para punir Magneto diante de toda a mídia. Usando um traje especial e uma arma capaz de atingir o mutante, um sujeito autointitulado Executor X consegue invadir a ONU e infligir um ataque bastante intenso à segurança do local e aos próprios X-Men, enquanto tenta se posicionar para acertar o seu alvo.
Enquanto a Vampira tenta conter o avanço dos manifestantes do lado de fora e a Tempestade se encarrega de proteger o Magneto, cabe ao Ciclope, o Bishop e o Morfo baterem de frente com o vilão mascarado, o que acaba gerando um dos monólogos mais realísticos dessa nova leva de episódios:
Executor X (enquanto surra o Ciclope): “Sabe o que eu odeio na sua raça? Vocês agem como se sofressem muito. As pessoas normais sofrem também, até mais! Só temos a dignidade de não ficar chorando o tempo todo, entende? É a choradeira... eu odeio a sua choradeira tanto quanto odeio vocês!”
Não soa como um discurso tipicamente preconceituoso contra cotas para negros nas universidades ou qualquer outra aplicação que beneficie minorias no mundo real?
É inegável a quantidade de paralelos que podemos fazer entre esse discurso carregado de ódio do Executor X com a nossa realidade atual, e o quanto desse ódio vemos diariamente sendo destilado nas redes sociais. É claro que aqui é preciso traçar um paralelo simples entre os mutantes fictícios e qualquer outra minoria discriminada pela mente tacanha e conservadora daqueles que se veem presos a um antigo status quo do “macho predominante” ou do “homem branco heteronormativo” cuja única opinião é a que vale na sociedade. Para essa gente, qualquer coisa que saia minimamente do “normal” deve ser criticado, combatido e… executado, por que não?
Os mutantes não existem na vida real, mas quantas vezes não ouvimos por aí que luta de classes é “mimimi”? Ou que levantar pautas sobre direitos iguais entre homens e mulheres e a comunidade LGBT é “lacração”?
Alguém que está lendo esse texto acha mesmo que a existência de um Executor X que grite a plenos pulmões que a luta dos X-Men por igualdade com os humanos é “choradeira” não seria possível no mundo atual onde, por exemplo, os ditos “nerds” — que atualmente só são pessoas altamente preconceituosas que se escondem atrás da palavra — odeiam minorias e fazem de tudo para diminuir qualquer tipo de luta de classe em seus canais pela internet?
Vocês acham realmente que as histórias dos X-Men ao longo desses mais de 60 anos são apenas um amontoado de desenhos e balõezinhos rasos que só querem mostrar medição de poderes e nada além disso?
Faz sentido achar que os X-Men são como o Youngblood ou qualquer outra equipe de super-heróis fantasiados — e descerebrados — que não têm nada a dizer e que só estão aí há tanto tempo para fazer volume nas lojas de revistas em quadrinhos e não ensinar nada a respeito de acolhimento ou aceitação ao próximo? Sério mesmo?
Essa galera “entendida em cultura pop” presta mesmo a atenção nos balões de fala dos quadrinhos ou só consegue enxergar as figuras? Porque não é possível tamanha ignorância a respeito desses personagens que estão há tanto tempo ensinando tanta coisa pro público, em especial, a aceitação ao que é diferente.
De volta ao episódio, enquanto os X-Men lutam na ONU, a Jean Grey entra em trabalho de parto na mansão X e cabe ao Logan levá-la ao hospital para dar à luz. Após atravessar a cidade para chegar em segurança ao local, o médico de plantão se recusa a atender uma mutante, alegando que ela pode perder o controle dos poderes durante o parto e ferir as pessoas na sala.
Através do seu contato telepático, Jean pede a ajuda do marido, que avisa a Tempestade do que está acontecendo. Ororo sugere que a Vampira encaminhe o Ciclope da ONU até o hospital e os dois partem em velocidade a fim de ajudar Jean. Uma vez lá, a Vampira usa os seus poderes de absorção para “aprender” as habilidades do obstetra e faz ela mesma o parto. Algum tempo depois, o casal feliz com o nascimento de seu filho se reúne mais uma vez e Jean dá ao bebê o nome de Nathan.
Como no universo regular das HQs a Jean Grey original nunca engravidou do Scott, antes de saber que o bebê era um menino, eu jurava que seria a Rachel Summers a nascer ali, mas foi apenas um segundo de esperança que morreu rápido. No entanto, para ser ainda mais óbvio da real identidade daquele bebê, só faltou o olho brilhar para a câmera (vamos falar mais disso no próximo post!).
Na ONU, após se livrar do Bishop e do Morfo, o Executor X consegue, enfim, atirar com o seu rifle em direção ao Magneto, é quando a Tempestade se joga na frente para salvar o homem colocado no comando dos X-Men. Embora ninguém saiba àquela altura dos fatos, a arma do vilão é carregada com uma variação mais ostensiva da radiação usada nos colares que inibem os poderes mutantes, e a Rainha dos Ventos acaba sendo atingida em cheio por um tiro dela.
Livre de suas amarras e entendendo de imediato o que aconteceu com a Tempestade, o Magneto resolve punir o Executor, o privando de sua arma e o tratando como a uma marionete com os seus poderes magnéticos. Depois, ele resolve mostrar o que é capaz de fazer, elevando não só o Executor como também a todos os membros do júri a uma altitude impensada. Lá de cima, com praticamente o planeta a seus pés, e sob o olhar desesperado dos agentes da ONU, ele implora para que a humanidade não o faça se voltar contra ela, pois as consequências podem ser gravíssimas.
Para quem não é das antigas, a Tempestade também foi atingida por uma rajada quase letal que a deixou sem seus superpoderes de controle climático por um longo período nas HQs. Na época, ela se jogou para salvar a Vampira de ser fulminada, mas isso rendeu uma ótima fase da heroína que culminou nela se tornando líder dos Morlocks — vencendo a Callisto no mano-a-mano — e saindo na mão com o Ciclope pelo direito de liderar os X-Men.
Além disso, a fase badass da Ororo ainda rendeu a ela o clássico traje punk — que ela usa na cena pós-crédito do episódio 2 da animação —, e o seu reencontro com o Forge, o mutante indígena capaz de inventar qualquer coisa.
Desprovida de seus poderes e se sentindo desconectada dos irmãos mutantes, Ororo escreve uma carta emocionada endereçada a Jean e, assim, ela parte da mansão, com destino incerto. Quando achamos que nada pior pode acontecer aos nossos heróis, uma visita inesperada chega ao portão deles, e eis que surge uma mulher ruiva com as feições idênticas às de Jean Grey diante de todos. Aparentemente ferida, ela desmaia no colo do Morfo, criando uma situação no mínimo assustadora para o Ciclope e a sua esposa, que acabaram de retornar do hospital com o pequeno Nathan no colo.
A análise de X-Men’97 continua no próximo post…
NAMASTE!