31 de agosto de 2019

Crítica – Era Uma vez em Hollywood


Em 1969 o autointitulado “guru” Charles Manson protagonizou um dos capítulos mais aterrorizantes de Hollywood ao encomendar o assassinato da atriz Sharon Tate e seus amigos em uma residência da Cielo Drive. Atrás de uma fama que não conseguia e com a ideia fixa de que ele era a reencarnação de Jesus Cristo, Manson e seus seguidores iniciaram uma cruzada racista e preconceituosa em Los Angeles, cidade para o qual ele se mudou em busca de seu sonho de se tornar um músico tão bem-sucedido quanto John Lennon, seu ídolo. Rejeitado por vários produtores musicais devido a qualidade duvidosa de sua “obra”, o guru com suas alucinações decidiu se vingar, o que acabou levando seu bando ao endereço na Califórnia, onde Sharon Tate morava com o marido cineasta Roman Polanski

Tate havia participado de diversos filmes como “Olho do Diabo” (1966), “A Dança dos Vampiros” (1967) e “O Vale das Bonecas” (1968), e estava grávida de oito meses quando foi brutalmente esfaqueada e morta em sua casa. Levou-se muito tempo para que as investigações da Polícia ligassem o crime chocante a Manson e a seu culto, mas ele e seu bando (em sua maioria mulheres) foram levados à justiça. Os hippies seguidores de Manson moravam no Rancho Spahn e se alimentavam de restos das lixeiras enquanto perambulavam pela cidade em busca de mais seguidores para a seita. O Rancho anteriormente era usado como set de gravação de filmes de faroeste, e quando foi abandonado, serviu perfeitamente para os planos de Charles de aterrorizar Hollywood.

Essa é a realidade dos fatos.

Era Uma Vez em... Hollywood é uma história fictícia que insere os personagens Rick Dalton (Leonardo DiCaprio) e Cliff Booth (Brad Pitt) em meio aos acontecimentos reais do trágico ano de 1969, mas não deixa de prestar uma homenagem à indústria cinematográfica norte-americana da época. 

No final da década de 60 os filmes de faroeste em preto e branco começavam a dar lugar a outros gêneros como comédias e espionagem, e o enredo principal é focado em Rick Dalton, um ator cuja carreira está em franca decadência enquanto ele envelhece e não consegue mais papeis de destaque. Ao lado do inseparável amigo Cliff, que é seu dublê e “faz-tudo” na casa onde ele mora em Cielo Drive, Dalton conhece o produtor Marvin Schwarz (Al Pacino) que o faz enxergar que sua carreira como vilão de bang-bang está perto do fim em Hollywood, e que seu destino é mesmo estrelar os "faroestes spaghetti" na Itália. 


Apesar de abalado com a possibilidade de ter que se mudar para salvar a carreira, Dalton continua cumprindo seus compromissos com os seriados de TV americanos em papeis menores, enquanto Cliff, ex-boina verde e acusado de ter assassinado a própria esposa, está em busca de emprego. A casa onde Dalton mora é vizinha da de Sharon Tate (Margot Robbie) e Polanski (Rafal Zawierucha) na Cielo Drive, mas não há interação entre os personagens quase até o final do filme, o que causa uma certa apreensão no espectador que conhece a história trágica do casal.


O ritmo que Quentin Tarantino impõe a seu nono filme (lembrando que ele diz que vai se aposentar depois do décimo!) é levemente diferente dos outros, o que denota um amadurecimento em sua forma de contar uma história. O roteiro de Era Uma Vez... é nitidamente uma homenagem ao cinema que ele cresceu assistindo – Tarantino nasceu em 1963 – e além das projeções que são exibidas o tempo todo, seja na tela do cinema visitado por Sharon Tate ou nas telinhas da TV, as cenas exalam Western e todo aquele clima glamouroso que gira em torno de Hollywood, algo que Charles Manson e seu bando tentaram perverter.


Apesar disso, esse novo ritmo imposto pelo diretor é bem lento e causa uma certa ansiedade, já que temos uma ideia do que ele quer contar, mas não vemos nem sombra disso na linha principal do roteiro. 

Damon Herriman e Al Pacino
Nós vemos Charles Manson - vivido pelo ator Damon Herriman e em dose dupla, porque o ator faz o mesmo papel na segunda temporada de Mindhunter - uma única vez nos portões da Cielo Drive, depois ele é citado muitas vezes já no Rancho Spahn, quando Cliff dá uma carona para “Pussycat” (Margaret Qualley), nós vemos os hippies da seita de Manson perambulando para lá e para cá, nós vemos Sharon Tate aproveitando sua quase-fama e curtindo com os amigos (inclusive dentro da Mansão da Playboy), e nós somos distraídos pelas desventuras de Dalton e Booth enquanto isso. Por duas looongas horas.

É como se estivéssemos esperando o tempo todo o desfecho do filme, esquecendo de curtir os pormenores, marca indelével de Tarantino atrás das câmeras. Todos os detalhes estão lá: Close em pés femininos (paixão do diretor), silêncios onde podemos apreciar as expressões de um ator em sua atuação, as músicas muito bem encaixadas (e subitamente interrompidas também), muitas cenas a bordo de veículos, onde pegamos uma carona com o motorista no banco de trás, e claro, violência desenfreada!


O elenco de Era Uma Vez em... Hollywood é bem extenso e variado. As figurinhas carimbadas nos filmes de Tarantino estão lá novamente, como Michael Madsen, Zoë Bell (a dublê de Uma Thurman em Kill Bill) e Kurt Russel fazendo papeis menores, mas o roteiro dá espaço para todos eles. O veterano Bruce Dern brilha como o frágil e cego George Spahn, dono do Rancho e antigo conhecido de Booth nos tempos de dublê; Emile Hirsch vive Jay Sebring, o melhor amigo do casal Polanski (que na história real acaba sendo assassinado com Sharon); Ganha destaque ainda a ex-atriz-mirim Dakota Fanning como Lynette, a amante de George Spahn, Damian Lewis como Steve McQueen e Maya Hawke (a Robin da terceira temporada de Stranger Things), filha de Uma Thurman e Ethan Hawke, que faz uma das hippies que moram no Rancho (especificamente a que diz que esqueceu a faca no carro e se manda!).

Emile Hirsch e Dakota Fanning

Quem rouba mesmo a cena, atuando ao lado de Leonardo DiCaprio, enquanto seu personagem aguarda para filmar a série de TV que co-protagoniza, é a pequena Julia Butters de 10 anos. Com um diálogo firme e consistente, ela impressiona, dando vida a uma jovem atriz-mirim que não gosta de sair do personagem enquanto está no set. As cenas em que ela e DiCaprio atuam juntos chegam a ser engraçadas, e a pequena dá conta do recado, entregando muito bem seu texto. Metalinguagem pura... Uma atriz mirim que interpreta uma atriz-mirim que não gosta de sair do personagem... Vixe!
Julia Butters em cena com DiCaprio

Outro destaque do filme é a atriz Margaret Qualley que com sua Pussycat, uma das ripongas juvenis de Manson, não se envergonha em se insinuar para Cliff, que a leva até o Rancho no carro de seu amigo e chefe. Vale lembrar que a personagem de Qualley representa a liberdade sexual que a comunidade de Manson pregava, onde todos transavam com todos em Spahn enquanto bebiam e se drogavam, e isso acabou sendo comprovado nos depoimentos reais dados pelas representantes da seita de Manson quando estas foram presas pelo assassinato de Sharon Tate. 


Não devo ser o único espectador que sai de casa para ver o novo filme de Quentin Tarantino independente da história ou de quem está protagonizando, mas por se tratar de um roteiro fictício que se passa em meio a fatos, tem certos elementos que esperamos que aconteça na tela e é aí que o diretor de 56 anos surpreende, levando o enredo para um caminho completamente inesperado. Lembra o que aconteceu com Hitler ao final de Bastardos Inglórios (2009)? É mais ou menos por aí que a coisa anda em Era Uma Vez em... Hollywood, e isso não enfraquece o filme, que como o próprio título insinua, é um faz de conta

Tarantino prova que ainda está em forma depois de algumas décadas por trás das câmeras. A sequência final da invasão dos hippies ao endereço da Cielo Drive e tudo que acontece entre eles e os personagens de Pitt e DiCaprio chega a ser revigorante, premiando o espectador por ter esperado todo aquele tempo pelo rompante de violência tão característico na filmografia do diretor. 

Enquanto os personagens fictícios ganham até certa relevância com o roteiro, falta mais profundidade à Sharon Tate de Margot Robbie. 

Ela passa um ar de inocência e doçura com sua interpretação – Tirando ainda o fato de que Robbie é linda que dói – mas a personagem mais parece um bibelô de luxo no filme do que alguém realmente importante e profundo. 

Uma das críticas ao filme, aliás, é a forma superficial com que Tarantino (que também escreve a história) trata as mulheres no filme, a famosa “objetificação feminina” (com closes em bundas e pernas). Para quem conhece o estilo “tarantinesco”, porém, não é uma grande surpresa e não chega a ofender. Vale lembrar que o cara deu não só um, mas DOIS filmes dedicados a uma das personagens femininas mais badass motherfucker do cinema: Beatrix Kiddo de Kill Bill. E isso fala por si próprio sobre a superficialidade de suas personagens femininas. 


Só lamentei não ter tantas referências cinematográficas para curtir plenamente as homenagens que Tarantino faz ao longo de Era Uma Vez... Além dos filmes, muitos atores, atrizes e diretores são lembrados, e a relação de elenco mostra muitos “easter-eggs” desse tipo, dos quais deixei passar muitos. 
Uma das sequências que mais me empolgaram no trailer foi a que Brad Pitt enfrenta o próprio Bruce Lee (interpretado por Mike Moh), mas no filme serve apenas como uma piada em que Cliff Booth se imagina de volta ao set de filmagens, caindo na porrada com Lee e VENCENDO! Toda a forma arrogante com que Lee é representado no filme parece bem desrespeitoso, e isso repercutiu negativamente com os familiares do ator chinês e seus amigos. 

Em meus devaneios, por algum instante vendo esse trailer outrora, eu achei que Tarantino tinha usado imagens reais de Bruce Lee e inserido Brad Pitt na cena, mais ou menos como aconteceu em Forrest Gump, onde Tom Hanks acaba colocado em vários momentos famosos da história americana... Mas não foi bem assim que aconteceu.

Perto de Os Oito Odiados (filme que caracterizo como o mais fraco da carreira de Tarantino), Era Uma Vez em... Hollywood é uma obra de arte. Tem alguns problemas de ritmo, cria expectativas que não são saciadas, demora para engrenar, mas entrega um enredo muito bom de ser assistido e apreciado, no melhor estilo Quentin Tarantino, que continua sendo para poucos.

NOTA: 8,5

Há muito tempo numa galáxia muito, muito distante eu escrevi sobre Django - Livre aqui:


Kill Bill (Vol. 1 e Vol. 2) aqui:


E um Top 10 Trilha Sonora de Tarantino aqui:


P.S.  - Pela primeira vez NA VIDA Brad Pitt está começando a aparentar a idade que tem, e a carinha de neném característica já não consegue mais ser vista embaixo das rugas que abundam em seu rosto... Mas olha o físico desse filho da mãe! O cara tem 55 anos com corpinho de 25. É muita humilhação para nós pobres mortais! 


NAMASTE!

30 de julho de 2019

Review - O Rei Leão 2019


♫Nants ingonyama bagithi baba♪!!


O Rei Leão de 1994 é a animação da Disney mais importante na minha vida, isso porque foi o primeiro filme que eu assisti em um cinema. Eu era um moleque magrelo e cabeçudo de 11 anos, e lembro de ter ficado admirado por estar vendo uma projeção cinematográfica junto dos meus amigos de escola pela primeira vez na vida. O cinema era um daqueles de cidade do interior, pequeno e limitado por sua capacidade técnica, mas para o pouco que tínhamos na época, aquela foi uma das melhores experiências da minha infância. Os temas musicais do desenho naquele som alto, as imagens coloridas, a extraordinária dublagem brasileira, as lições do filme... Tudo aquilo me atingiu em cheio, e marcou para sempre o pequeno e tímido Rodman que ainda há em mim. Ver o remake de The Lion King 25 anos depois era algo importante para mim, e está na hora de comentar os erros e acertos da versão live-action (ou não) de uma das maiores animações dos estúdios Disney.


Antes de partir para o cinema e conferir a nova versão de O Rei Leão dirigida por Jon Favreau (o Happy Hogan de Homem de Ferro e também o diretor de Mogli - O Menino Lobo), eu fiz a lição de casa e REVI a animação clássica, algo que eu não fazia há alguns anos. Vale dizer que os primeiros minutos da canção "O Ciclo sem Fim" (versão em português de "Circle of Life") já fizeram esse velho escritor ir às lágrimas, algo que só acreditava que iria acontecer lá pelos 30 minutos de projeção mais ou menos, quando um certo leão despenca de uma certa montanha. Era a nostalgia que havia em mim fazendo efeito, claro, mas valeu pela comparação de sentimentos entre um filme e o outro. 


É importante pontuar que O Rei Leão de 2019 carece do peso dramático que a animação clássica carrega, traço que a tornou sucesso entre as crianças dos anos 90, mas é difícil comparar uma animação em 2D, com personagens antropomórficos (cheios de expressões humanizadas) com o desbunde visual em 3D que é a nova versão. 


Desde que o primeiro trailer  da adaptação foi veiculado, começou aquela discussão sobre o filme ser ou não considerado um live-action (que em geral é uma produção realizada por atores reais), e foi o próprio diretor que acabou tirando essa dúvida, ao dizer que há 1490 cenas renderizadas criadas por animadores e artistas de efeitos visuais no filme, e apenas uma cena produzida pela equipe de fotografia, ou seja, de um cenário real africano. 


A cena em questão é a primeira do filme, que mostra o amanhecer no cenário africano que qualquer pessoa no mundo seria capaz de reconhecer:

O único cenário real do filme

Eu não assisti o filme em qualidade IMAX, mas o que vi na cópia normal é de um absurdo visual que chega a impressionar na tela. Sabendo que tudo aquilo que foi apresentado é fruto de um estúdio e de uma equipe técnica, incluindo aí a movimentação dos animais (que em geral é o que MAIS entrega a imperfeição de uma animação), os cenários com árvores, montanhas e rios, não há como não dar os parabéns a Jon Favreau e os animadores da Disney pelo magnífico trabalho realizado nesses quase dois anos de produção. 


O filme anterior de Favreau para a Disney (The Jungle Book) também possui muitos animais criados em CGI, e com uma diferença de apenas quatro anos entre a produção de um e de outro já foram feitos avanços incríveis na computação gráfica, o que possibilitou uma imersão maior na história de O Rei Leão do que em Mogli, que possui uma animação menos bem cuidada devido a limitação da "época".

Os animais de The Jungle Book de 2016

 Com dez minutos de filmes você já percebe que não está vendo um filme qualquer de animação, e sim algo que beira a perfeição dos detalhes técnicos. É comum um designer gráfico assistir um filme procurando erros, algo para o qual nossos olhos são treinados a vida quase toda em pró do perfeccionismo, e devo confessar que não encontrei muitos dessa vez. 


E a história, Rodman? Segue o que foi mostrado na animação antigona dos tempos da vovó?

Sim, caro padawan geração Z! Jon Favreau tomou o cuidado de reproduzir a animação de 1994 quase que nos mínimos detalhes, sem trazer muita coisa nova para seu filme além de algumas cenas de ligação entre momentos importantes, como o que faz Nala, já adulta, tomar a decisão de procurar ajuda para salvar as leoas do reinado de terror imposto por Scar. A única cena de grande importância na animação clássica que foi retirada é a que Rafiki (dublado por John Kani, o Rei T'Chaka de Pantera Negra), o babuíno, ensina ao Simba adulto a importância de aprender com os erros do passado em vez de tentar esquecê-los. No live-action, logo que Simba vê a imagem do pai Mufasa no céu, ele já entende que precisa retornar para a "Pedra do Rei" e retomar seu lugar de direito, enquanto que na animação é Rafiki quem lhe dá um "empurrãozinho" antes disso. 


De resto, toda a animação clássica está lá, com um ou outro diálogo modificado, mas cuja essência permanece a mesma. O filme começa com os animais da selva africana reverenciando o nascimento de Simba abaixo da Pedra do Rei, logo em seguida vemos a disputa ideológica entre Mufasa e seu irmão Scar, que se sente enciumado pelo nascimento do sobrinho (herdeiro legítimo do "trono"), e que mais tarde o faz colocar a vida do leãozinho em risco na sequência do Cemitério de Elefantes, junto a amiguinha Nala. Toda a sequência entre o resgate de Mufasa aos dois filhotes no cemitério, espantando as hienas, e o estouro da manada de gnus que culmina na morte de Mufasa, é muito bem realizado visualmente, porém, não possui nem de longe a carga dramática que o desenho de 94 descarrega no espectador. Aqui pode haver algo de nostalgia e preciosismo em meu texto, talvez minha criança interior gritando tal qual um millenial mimado que "A MINHA ANIMAÇÃO É MELHOR QUE O FILME", mas a emoção não está visível nas expressões (ou falta de) do leãozinho Simba no momento em que ele vê o pai caindo do desfiladeiro para a morte ou quando o encontra já morto lá embaixo. Cara! Essa cena me destruiu na infância, e segue até hoje como uma das coisas mais traumáticas que já vi nos cinemas, mas no novo live-action não causou a mesma sensação. Como foi com vocês?


Sobre a "falta de expressão" dos animais do filme, é como já foi dito: Eles representam animais REAIS, e não é muito comum ver animais de verdade fazendo caretas ou arregalando os olhos em situações de perigo como é muito comum ver nos desenhos. As reações de espanto e apreensão estão visíveis em Simba pela sua postura. É um sutil mover de orelhas, uma rápida balançada na cauda que nos faz entender que ele está assustado ou com medo. Pare o que está fazendo agora e observe o seu gato aí deitado no sofá. Ele não vai fazer muitas caretas se sentir ameaçado, mas o seu corpo vai demonstrar o que ele está sentindo as vezes de forma sutil, como no filme. 

Pouca expressão ou MUITA expressão?

A história se segue, e é hora de sermos apresentados a dupla cômica Timão e Pumba, que são tão divertidos e engraçados quanto suas versões em 2D, que foram eternizadas naquele desenho que passava no Disney CRUJ do SBT em tempos remotos. 


Com piadas atualizadas, mas mantendo a essência da animação, os dois continuam tirando risos da plateia, o que consegui perceber na sessão em que assisti. 


A galera caiu no riso diversas vezes! 

É bem engraçado ver o suricato Timão realista se movendo rapidamente pelo chão como um furão ou parando de pé sob as patas traseiras como sua versão animada, mas é importante pontuar que o absurdo do personagem no desenho (como ele dançar Ula-Ula para atrair as hienas!) faz bastante falta. 


As hienas Shenzi, Banzai (que não chega a ser chamado assim no filme) e Ed (que fala normalmente e tem menos "problemas psiquiátricos" que do desenho) são bem mais sombrias e sérias que suas versões anteriores, e por todo o filme o trio está sempre acompanhado da alcateia inteira de hienas que mais tarde ajudam Scar a reinar. 


Durante o filme, com nossa visão adulta e entendendo que aquilo é uma fantasia beeeem amena do que é a natureza real, é possível perceber alguns equívocos conceituais que a história traz, como os animais reverenciarem o "rei" leão que mais tarde vai matá-los sem qualquer piedade para se alimentar, ou a tal história do "ciclo da vida" em que os antílopes irão se alimentar do gramado que cresceu sobre os corpos de leões mortos (algo do qual Timão e Pumba riem desenfreadamente pela noção de cadeia alimentar que eles têm nítida em mente). 


A grande injustiça cometida em O Rei Leão, porém, é a de que o macho-alfa (no caso Scar) sai para caçar enquanto as leoas aguardam que ele traga o alimento. No filme, Scar e as hienas caçam a comida, e ele ameaça Sarabi (a mãe de Simba, dublada na versão original por Alfre Woodard, a Mariah da série Luke Cage) de que ela ficará sem alimento caso não aceite ser sua rainha. Na vida animal TRUE, é a leoa quem sai pra caçar, enquanto o leão posa de "rei" na alcateia, por isso é dado um pouco mais de evidência a personagem de Nala, que desde filhote se mostra mais hábil que Simba no combate corpo-a-corpo. 


Claro que o fato da poderosa Beyoncé ser a voice-actress da Nala adulta no filme conta bastante também para seu destaque, que na animação de 2019 é bem mais decisiva que sua versão de 1994, servindo não só como a "companheira" do futuro rei, como também a "voz" de coragem da alcateia, levando as leoas a combaterem os mandos e desmandos de Scar.


Falando da atuação dos atores e atrizes que deram vida aos personagens em CGI, apesar da força desse elenco, é importante dizer que em alguns momentos é meio decepcionante ouvir os diálogos entre eles, como se faltasse um pouco de "mojo" em suas interpretações. A própria Beyoncé parece pouco à vontade em dar voz a Nala logo que ela surge na floresta depois de perseguir o gorducho Pumba, e suas falas só vão ganhando força posteriormente, no decorrer da história. 

Chiwetel Ejiofor

O mesmo acontece com o
Chiwetel Ejiofor dublando Scar, soando em grande parte do filme contido demais, o que é imensamente recompensando na canção "Be Prepared" em que ele canta a plenos pulmões, lembrando a performance de Jeremy Irons e seu sotaque britânico evil, com a mesma canção em 94. 

O elenco de O Rei Leão 2019

A dupla Billy Eichner e Seth Rogen, por outro lado, parece esta bem afinada com seus personagens, e tanto nos diálogos cômicos quanto nas canções de Timão e Pumba, os dois conseguem divertir igualmente, a exemplo do que fizeram Nathan Lane e Ernie Sabella em 94 na versão americana, e também nossos queridos dubladores brasileiros Mauro Ramos (Pumba) e Pedro de Saint Germain (Timão), ator que faleceu recentemente, deixando muita saudade de sua dublagem épica com o suricato magricela. 

Billy Eichner e Seth Rogen

Donald Glover como o Simba adulto é um dos melhores em cena, dando leveza ao personagem em sua versão "Hakuna Matata" com os amigos trapalhões na selva, e força quando Simba retorna para tomar o reino de seu pai de volta.

Donald Glover

Tanto cantor quanto ator, Glover impressiona na música "Hakuna Matata", tema icônico da animação clássica, e seu dueto com Beyoncé em "Can You Feel the Love Tonight" é lindo... Apesar da cena em si perder um pouco da essência por se passar DE DIA! Em tradução livre a música quer dizer "Essa NOITE posso sentir o amor" ou como ela foi traduzida para o português "Essa NOITE o amor chegou". Porra, Jon Favreau!

Esse DIA o amor chegou!

A única voz mantida da animação clássica foi a de James Earl-Jones, que nos dois filmes interpreta Mufasa. A imortal voz do Darth Vader soa imponente nos ensinamentos do experiente leão a seu filho Simba, e foi uma homenagem justa de Favreau a esse que é um dos melhores voice-actor de todos os tempos. 


No Brasil, as vozes dos personagens ficaram a cargo de Saulo Javan (Mufasa), que substituiu o inesquecível Paulo Flores, o intérprete do personagem em 1994, falecido em 2003, Graça Cunha (Sarabi) no lugar da icônica Maria Helena Pader, Rodrigo Miallaret (Scar) no lugar do insubstituível Jorgeh Ramos, falecido em 2014, Ivan Parente e Glauco Marques dublam Timão e Pumba e os astros globais Ícaro Silva e a cantora e atriz Iza dão voz a Simba e Nala adultos respectivamente. Pra quem assistiu a versão dublada, não faltaram críticas ao trabalho realizado pela equipe brasileira, o que é uma pena, considerando o legado que a animação de 1994 carrega como uma das mais perfeitas dublagens nacionais de todos os tempos. 

O elenco brasileiro de dubladores

Apesar de não ter toda a emoção que o desenho tem, O Rei Leão é um filme muito bom, que impressiona com o CGI quase perfeito dos animais selvagens e que não deve decepcionar a criançada que nunca deve ter ouvido falar da animação de 1994, ou que nem sabe o que é um videocassete para ver o VHS verde de O Rei Leão. 


O Rei Leão de 1994 faturou nas bilheterias US$ 968 milhões, ficando na 44ª posição do ranking de maiores bilheterias do mundo (pouco acima de The Jungle Book, de Jon Favreau, com US$ 965 milhões). The Lion King de 2019 já está perto de faturar US$ 1 bilhão nas bilheterias até o término desse post, e provavelmente vai brigar pelo topo da lista, já que só está em sua terceira semana de exibição.     

O Rei Leão (1994): Nota 10
O Rei Leão (2019): Nota 9

P.S. - A trilha sonora do filme é assinada por Hans Zimmer, assim como a do filme dos anos 90, e mesmo as versões novas de canções clássicas como a própria "Circle of Life" impressionam bastante. A canção "Spirit", em que Beyoncé canta solo é bem emocionante, e vale a pena ouvir a soundtrack completa.

P.S. 2 - Na época da animação, o chiclete PING PONG lançou o álbum de figurinhas de O Rei Leão, e eu e minha irmã ficamos com algumas cáries na tentativa de completar o álbum! 


NAMASTE!

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