21 de julho de 2019

Do Fundo do Baú - Hellboy



Na primeira década do século XXI eu cursei a graduação de Design Gráfico, e um dos meus semestres preferidos foram com as aulas de cinema da professora Maria Goretti Pedroso. Nele aprendíamos a decupar um filme inteiro e enxergar obras cinematográficas como algo mais do que duas horas de diversão em frente a tela. Depois daquelas aulas, eu nunca mais encarei o cinema como apenas uma diversão de momento. O texto abaixo é uma resenha que escrevi sobre o filme Hellboy (2004) para a matéria de Vídeo Design, e ele foi um dos motivos que me fez querer escrever para o Blog do Rodman posteriormente. Bora relembrar um dos mais bem feitos filmes de super-heróis do cinema, lançado há 15 anos?

Hellboy

Em 1944, os nazistas estão com a guerra praticamente perdida, e só um milagre, ou algo terrivelmente contrário a isso, pode fazê-los reverter essa situação. Grigori Rasputin conselheiro místico dos Romanov, é o homem que aceita o desafio de perpetrar tal milagre, e utiliza seus conhecimentos sobre ocultismo para mesclar ciência e magia negra, a fim de trazer para a Terra Ogdru Jahad, os Sete Deuses do Caos. A ideia por trás de suas intenções malignas é clara: Vencer os inimigos com o poder de Jahad, destruir o mundo e das cinzas fazer renascer um novo Éden.


O clima é sombrio, os soldados americanos orientados pelo jovem Trevor Bruttenholm (ou Dr. Broom), o consultor pra assuntos paranormais do Presidente Roosevelt, estão perto da Costa da Escócia, designados para impedir os planos diabólicos dos nazistas. A chuva torrencial que cai, aumenta o clima nebuloso, os soldados estão assustados, e a cena do filme a todo momento permanece em nuances de prateado e azul, reforçados por efeitos de coloração pós-produção. A trilha sonora sofre um crescente quando enfim é mostrado o ritual onde Grigori, junto a seus dois asseclas, Kroenen e Ilsa, estão preparando a chegada de Ogdru Jahad, e o Dr. Broom, desesperado, pede para que o exército interfira. O local então é invadido, e começa uma batalha para tentar impedir que Rasputin libere os Sete Deuses do Caos com o portal que já está aberto.


No início do conflito o Dr. é atingido com um tiro próximo do joelho direito, e começa a se rastejar enquanto o assassino Kroenen derrota vários soldados ao mesmo tempo com tiros, depois com duas lanças que saltam de seus antebraços. O vilão já demonstra que não é um mero mortal, como anteriormente o próprio Dr. destaca num diálogo entre ele e um soldado. Ele é baleado e nada acontece. Observando o Dr. a se rastejar ferido enquanto vence os adversários, Kroenen nota que suas intenções podem colocar o plano de Rasputin em risco, e o vê arremessando uma granada contra o portal. Antes que ela exploda, Kroenen tenta em vão apanhá-la entre as engrenagens, e logo em seguida de ter os dedos da mão decepados  pelo aparelho que gira energizado por uma manopla controlada por Rasputin, Kroenen é arremessado pela explosão, e acaba empalado contra uma parede por um restolho da máquina que é destruída. A ação de Broom faz com que Rasputin perca o controle sobre as energias que mantêm a fenda dimensional aberta, e ele é sugado pelo portal, desaparecendo em pedaços. Ilsa é a única que escapa com vida, sabendo que terá muito tempo pela frente graças a um “encantamento” feito por seu amante Rasputin.

Embora tenha impedido a vinda de Ogdru Jahad à Terra, o Dr. Broom sabe que o portal ficou aberto por tempo suficiente para que algo possa ter atravessado. Enquanto cuida dos ferimentos e se protege da chuva dentro de uma caverna, enfaixando a perna atingida pelo tiro, o Dr. conta a história de Rasputin para um soldado. Alguns relatos, até então dados como reais, se estudados, dão conta que o homem já sofreu todo tipo de tortura e permaneceu vivo. Nesse meio tempo, algo se move rapidamente dentro da caverna, e logo o Dr. e o soldado vêm uma criatura vermelha a saltar assustada ante os tiros disparados pelo homem. O monstrinho é confundido de início com um macaco e o Dr. Broom logo percebe que a criaturinha vermelha não é o que parece e que só está com medo. Oferecendo-lhe um chocolate, Broom ganha-lhe a confiança e o acolhe logo depois que ele salta para seus braços. A criatura logo é identificada como um menino demônio, e todos os soldados se afeiçoam a ele, batizando-o de Hellboy. Tem início então toda a história do filme. 

   
Desde o início do filme Guillermo Del Toro, o diretor e roteirista da película, procura fielmente transpor o clima dos quadrinhos criados por Mike Mignola para a tela, recriando todo o universo anterior à primeira aparição do menino demônio, ainda em meados de 1944. Mignola que esteve presente em toda a produção auxiliando Del Toro na transposição de seu personagem para o cinema, participou ativamente, o que tornou Hellboy um dos filmes inspirados em heróis de quadrinhos mais fieis dos últimos anos. A sequência inicial, ambientada na Costa da Escócia, mostra de forma competente todo o clima de guerra, e mostra uma ameaça nazista iminente que precisa ser detida a qualquer custo. A interação entre os personagens principais, Dr. Broom e o General, as pitadas de sarcasmo do militar em relação ao cargo de Broom, à sua religião e a sua forma pouco convencional de demonstrar os fatos serve perfeitamente como contraste com a malignidade de Rasputin e seus asseclas, que em nome do Führer, desejam libertar os Sete Deuses do Caos para instaurar a destruição na Terra e consequentemente a vitória sobre os inimigos. Tudo é ambientado para realmente parecer algo maligno, e o posicionamento de câmera, bem como a cenografia e a iluminação, aliados aos efeitos visuais (da manopla de Rasputin ao próprio portal que ela abre), tudo se encaixa perfeitamente presenteando o espectador uma das mais belas sequencias do filme inteiro.


60 anos se passam desde a primeira sequência, e então é hora de conhecer os personagens que farão parte do restante do filme. Já sabemos qual a origem (infernal) do menino demônio, e somos transportados diretamente para seu presente, que eles chamam no filme de dias atuais. Uma ótima sequência de imagens sobrepostas, vídeos e vozes num rádio nos ambientam, e informam que Hellboy (Ron Pearlman) agora é uma espécie de lenda urbana. Ele vive no Bureau de Pesquisa e Defesa Paranormal, a agência criada por Trevor Bruttenholm (o homem que o criou desde garoto como um pai, vivido por John Hurt), com o consentimento do governo e que existe disfarçada como uma empresa de reciclagem de lixo. O espectador é levado para o interior do Bureau junto ao jovem agente do FBI John Myers (vivido por Rupert Evans), que é escolhido entre vários agentes (mais de 70 candidatos graduados) pelo próprio Dr. Broom, que descobre que está morrendo de uma misteriosa doença. Preocupado em deixar seu filho sem assistência, ele vê em Myers um sucessor responsável a altura para auxiliar Hellboy, e o apresenta ao fantástico mundo dentro das paredes do Bureau. Myers se depara com o homem-peixe denominado Abraham Sapien (Doug Jones), aparentemente encontrado por acaso há muitos anos atrás (precisamente no dia em que o então Presidente americano Abraham Lincoln faleceu). Fica no ar um mistério de o que realmente Sapien é, um experimento genético, um mutante ou uma criatura evolutiva, mas Del Toro não se preocupa em esclarecer tais dúvidas do espectador, como acontece frequentemente durante o filme.


É chegada a hora então do coadjuvante se encontrar com o personagem título, e uma breve passeada pelo “quarto” de Hellboy nos mostra um pouco de sua personalidade. Somos auxiliados pelo agente Clay, até então o “babá” do demônio, para entender um pouco mais como ele é, e Myers se depara com um lugar infestado de gatos, vários televisores ligados mostrando a mesma moça (mais tarde descobrimos se tratar de Liz Sherman) e o homem-demônio a se exercitar enquanto fuma um charuto. A surpresa de Myers ao ver Hellboy é hilária, e vamos nos acostumando a personalidade “certinha” do personagem, que contrasta com o humor seco e as vezes sarcástico do personagem principal.  Pai e filho estão brigados, e “de castigo” Hellboy está preso no quarto por causa de suas aparições públicas sem autorização. Broom deixa claro que quer Hellboy nas ruas apenas para combater monstros.


A sequência seguinte, uma das mais bem realizadas em matéria de dinamismo, mostra exatamente Hellboy em ação, logo que um sinal de emergência soa no Bureau. Após o panorama geral dos personagens, é hora de ver o Vermelho trajado pela primeira vez com seu “uniforme de combate”, o mesmo sobretudo marrom amarfanhado que ele usa nos quadrinhos. Abe Sapien, pela primeira vez em cena fora do "aquário" em que foi apresentado, mostra que pode sobreviver fora da água com um suporte que mantém hidratada suas guelras, outro cuidado que Del Toro tomou para transpor o personagem o mais fiel possível à tela. Trazido a cidade dentro de um caminhão de lixo camuflado, Hellboy, Sapien, Dr. Broom e Myers são levados até a Biblioteca da cidade, que naquele momento está isolada por faixa policial com algo anormal preso lá dentro. A essa altura já sabemos que todos os vilões principais estão de volta, e após mais uma ressurreição, Rasputin está ligado inteiramente à criatura no interior da biblioteca.

   
Rasputin agora renascido, em mais uma de suas tentativas de abrir o caminho na Terra para o que ele chama de Mestre, desperta a entidade conhecida como Sammael para provocar o caos. Em mais um de seus rituais, ele lança um feitiço na criatura, de que sempre que tombar, duas novas entidades se erguerão em seu lugar, criando assim um ciclo infinito. Sem saber disso de início, Hellboy se digladia com o monstro dentro da biblioteca, e descobre que ele se alimenta de pessoas. Ao ser arremessado para fora do prédio com um golpe, ao cair, Hellboy se encontra pela primeira vez com Rasputin que o chama de filho e lhe fala sobre seu verdadeiro nome. Intrigado, Hellboy aponta-lhe a arma, mas só encontra o vazio.


A sequencia seguinte é uma das mais impressionantes do filme. Sammael ganha as ruas, e Hellboy tem que persegui-lo para tentar detê-lo. O filho do inferno é ferido pela língua da entidade que se enrola em seu braço mais frágil, e Myers aparece para impedir que maiores danos sejam causados ao parceiro, que reluta a aceitar ajuda. Sammael salta entre prédios num belíssimo enquadramento de câmeras, o espectador se sente dentro da cena por algum tempo, e a computação gráfica trabalha muito bem a favor do filme. O monstro muito bem construído digitalmente passa toda a sensação de peso (quando pisa sobre um furgão, por exemplo) e seus movimentos são muito realistas. A perseguição leva Hellboy até um lugar movimentado onde ele encontra civis desprotegidos em meio a uma festa de Halloween, e após lançar uma bala sinalizadora na criatura, fica fácil seguir o rastro verde que ele começa a deixar para trás. Curioso na cena de perseguição, é que em um dado momento Hellboy salta de um prédio para cima de um caminhão, e nesse primeiro corte de imagem, nota-se com certa facilidade que ele pousaria de pé sobre o veículo, até porque não daria tempo dele pousar de outra forma. Há um corte de câmera para mostrar Sammael no chão a observá-lo, e quando a câmera volta para Hellboy, ele está caindo sentado sobre o carro.


A cena se desenrola até o túnel do metrô, onde Hellboy volta a perseguir Sammael, que desaparece durante algum tempo enquanto o herói procura se desvencilhar do condutor do Metrô que o espanca com um extintor. Outra cena curiosa é quando Hellboy toca os chifres em brasa por causa da fricção de ter sido "atropelado" pelo Metrô. Até então nenhuma informação nos é passada sobre sua invulnerabilidade a fogo, embora já possamos desconfiar por ele ser um demônio, mas ele sente dor quando toca os chifres. Por que ele sente dor? Por que está quente? 

  
A batalha entre Hellboy e Sammael se encerra com o herói eletrocutando a criatura utilizando a energia elétrica dos trilhos. Nessa cena então, através do comentário dele, descobrimos que ele é invulnerável a fogo por não ter sofrido nada com a descarga elétrica que dá cabo de Sammael. Computação gráfica é utilizada novamente para simular a briga entre os dois, e dessa vez a animação deixa um pouco a desejar. As feições de Hellboy estão horríveis, e ele se assemelha mais ainda a um macaco (como por vezes é chamado durante o filme). Nada, claro, que comprometa o desenrolar de uma das melhores cenas de ação do filme.


Hellboy é uma das adaptações de quadrinhos para cinema das mais competentes graças ao talento de Guillermo Del Toro e suas percepções de retirar o que há de melhor da HQ de Mike Mignola para seu filme. Ele dá destaque para personagens que crescem sozinhos como o torturado e aparentemente imortal Kroenen, que mostra toda a intimidade que possui com suas lanças. Liz (Selma Blair) também ganha força no decorrer da história, não só porque ela aprende a controlar os dons mutantes sobre o fogo, mas porque ela se torna o maior pronto fraco de Hellboy, quando ela vira prisioneira de Rasputin que a usa para forçá-lo a "aceitar" seu destino. É revelado que Hellboy é na verdade Anung un Rama, filho de Satã, e o homem destinado a permitir a entrada dos Sete Deuses do Caos na Terra. Um reinado de terror tem início, numa imagem em flashforward vislumbramos qual é a verdadeira missão de Hellboy na Terra, e o verdadeiro motivo pelo qual Rasputin o invocou na década de 40. Ele deve dominar o mundo, e o amor por Liz, e a vontade de reaver sua alma, o faz esquecer quem o Dr. Broom o ensinou a ser. Mais homem do que demônio. Felizmente a figura de bondade no agente Myers o faz relembrar disso no último instante, e ele quebra o elo de seu braço com a chave que abriria o portal para a entrada de Ogdru Jahad na Terra. A derrota de Rasputin e logo em seguida a do demônio cheio de tentáculos que ele libera de seu corpo, sela a primeira aventura de Hellboy nos cinemas, e Guillermo Del Toro finaliza sua história com grande estilo, deixando bastante pontas para serem aproveitadas numa sequencia do filme.

Hellboy é um filme bem menos comercial do que a maioria cujo tema é super-herói, e por ser uma obra de fã, tem todo um cuidado técnico a ser levado em consideração. A fotografia do filme é magnífica, as cores realçadas em pós-produção saltam aos olhos, deixando o vermelho da pele do personagem mais vivo e todas as outras cores em destaque. Cenas como as do início sob chuva, como as da perseguição pelas ruas e a do incêndio no hospital de Liz são memoráveis. Houve todo o cuidado para que o filme se tornasse realmente uma obra prima, e só não beira a perfeição devido os furos no roteiro. Del Toro deixou todo o clima dos quadrinhos envolverem o filme, mas as vezes o que funciona em uma HQ nem sempre funciona da mesma forma no cinema. Em alguns casos, nos sentimos perdidos com os personagens, e sente-se uma necessidade óbvia de conhecer os quadrinhos para poder entender melhor o filme, o que não devia acontecer. A grande parte da história é simples de entender, mas algumas origens são simplesmente ignoradas, como a de Kroenen, por exemplo.

Como pontos fortes, é impossível não citar a atuação de Ron Pearlman, que encarnou o demônio vermelho como poucos o fizeram num personagem de quadrinhos. Mesmo sob quilos de maquiagem, ele dá o carisma necessário ao personagem, e seu humor ácido e por vezes sarcástico o dá um quê de engraçado que conquista o espectador. Ele pode ser feio, ele pode ser um demônio, mas não deixa de ser o herói (ou anti-herói) pela qual torcemos. O talentoso Doug Jones que empresta seus gestos para o cativante Abe Sapiens também dá show, e embora a voz do personagem não seja sua, ele dá todo o tom fantástico ao homem-peixe, e cria o segundo personagem mais interessante do filme. Sua maquiagem também é uma das mais perfeitas, e quase nos esquecemos que não estamos olhando para um homem meio peixe de verdade dado a naturalidade com que Jones atua.


Com a clara escolha de Del Toro por uma adaptação mais fiel da HQ fica fácil perceber no filme os ângulos, iluminação, cores e todo tipo de aspecto estético presente nos quadrinhos de Mike Mignola, reproduzidos de maneira mais que eficiente na tela. Assim como em termos de direção isso é uma vantagem para o filme, deixando-o com o mesmo toque belo e sombrio que possui na revista, há de negativo apenas os exageros cometidos em algumas cenas, mas que passam perfeitamente despercebidas se levarmos em conta que sim, aquela é uma obra baseada em quadrinhos.  

Hellboy teve um orçamento de US$ 66 milhões e faturou apenas US$ 99,3 milhões. Ganhou uma sequência em 2008, Hellboy 2 - O Exército Dourado, também dirigido por Del Toro que faturou US$ 160,4 milhões, e por muitos anos falou-se numa sequência que nunca aconteceu, embora Ron Pearlman fizesse campanha à favor. Em 2019 o filme foi rebootado por Neil Marshall com David Harbour no papel principal, mas o filme fracassou nas bilheterias, rendendo menos que seu orçamento. 
Essa resenha foi escrita entre 2006 e 2010, e eu tirei 10! 

NAMASTE!           

10 de julho de 2019

Review: Homem Aranha Longe de Casa


Esse POST possui SPOILERS PRA CARALHO!


Quando o Homem Aranha foi introduzido no universo cinematográfico da Marvel em Capitão América: Guerra Civil, foi uma catarse quase que unânime entre os fãs do personagem dos quadrinhos, ainda mais porque a última adaptação do Cabeça-de-Teia, feita somente pela Sony, tinha sido um DESASTRE. Ver o Homem Aranha interagindo com o Homem de Ferro, enfrentando o Capitão América, fazendo piadinhas enquanto lutava ou agindo como um adolescente, algo que é o cerne de sua criação lá nos anos 60, FOI MUITO RECONFORTANTE, em especial por saber que agora ele estava em boas mãos. Desde 2008 a Marvel Studios vinha fazendo um excelente trabalho com os brinquedos que tinha em mãos, e não havia muitas razões para questionar que o que seria feito com o Aranha ia ser de alguma forma diferente. “É Marvel, cara! O que pode dar errado???


Procurando talvez distanciar o seu Homem Aranha em conjunto com a Sony (vale lembrar que os direitos sobre o personagem ainda são compartilhados) do que já havia sido mostrado nos cinemas desde 2002 (no início da trilogia do Sam Raimi), Kevin Feige e a Marvel optaram por fazer alterações no conceito básico do Amigão da Vizinhança, e é isso que acaba incomodando enquanto assistimos Longe de Casa


Desde X-Men (2000) já estamos bem acostumados a ver todo tipo de adaptação com os personagens que dificilmente conseguem se manter iguais a suas versões quadrinhísticas, mas quando essas mudanças vão além da aparência e acabam atingindo aquilo que é a essência do herói, é difícil acreditar que aquele é o mesmo cara que vemos nos gibis. Podemos aceitar um Wolverine de 1,90 m porque isso não altera em nada sua essência, mas por que temos que aceitar um Peter Parker que não aprendeu com a perda de seu Tio Ben que com grandes poderes vêm grandes responsabilidades?


Isso é mimimi de nerd, Rodman. Foda-se esse véio do Tio Ben. O Tony Stark é muito mais massa!


O fato de não haver um Tio Ben que inspire o heroísmo do Homem Aranha no MCU nem é o grande problema, jovem padawan. O que mais incomoda no Aranha do cinema é toda a sua subserviência com relação a figura paterna que ele encontra em Tony Stark desde Guerra Civil. Tudo que Peter Parker faz logo que assume sua persona colorida (com um traje criado por Stark) é para ter a aceitação do mentor. Ele enfrenta o Capitão América e sua equipe não porque com grandes poderes vêm grandes responsabilidades, mas porque Stark falou que é o certo. 


Ele é um garoto imaturo, OK, a gente entende isso, mas o Aranha nas HQs tinha 15 anos quando ganhou os poderes, e é justamente a morte do tio que lhe ensina a maior lição de todas, o que faz com que ele nunca mais queira falhar na vida. A jornada do Homem Aranha é basicamente essa, impedir que mais pessoas sofram por um descuido seu. O que faz do Aranha um herói essencialmente melhor do que muitos outros nas HQs é justamente o seu altruísmo. É não depender de ninguém para fazer o certo, e em especial não precisar agradar ninguém. 


Ver o Aranha depender da tecnologia de Tony Stark até para fazer seus uniformes chega a ser humilhante, o que afasta ele completamente de suas características mais básicas. Hoje todo mundo critica o Homem Aranha de Tobey Maguire, mas o seu Cabeça-de-Teia estava mais perto do cerne do personagem, o perdedor que faz de tudo para impedir que as pessoas a seu redor sofram, mesmo que isso arrebente sua vida pessoal no processo.


Isso é mimimi de nerd véio, Rodman. Foda-se esse Homem Aranha boca-mole do Tobey Maguire! O Tom Holland é muito mais massa!

Pode até parecer somente um mimimi, mas um Aranha que depende tanto de outras pessoas para fazer o que é o certo está bem longe de ser um herói digno de usar o traje teioso.

Longe de Casa

Todo mundo ficou encafifado com o lance dos cinco anos perdidos entre o estalar de dedos do Thanos em Guerra Infinita e o estalar de dedos do Hulk em Ultimato, e bastaram cinco minutos de Homem Aranha: Longe de Casa para Jon Watts (diretor) explicar o que aconteceu com as pessoas que desapareceram no primeiro estalar e retornaram no segundo. Basicamente foi um “foda-se” bem grande, e a teoria do “blip” diz apenas que todas as pessoas que voltaram cinco anos depois simplesmente retomaram suas vidas, incluindo os alunos de ensino médio. De volta à escola, Peter Parker (Tom Holland) e seus amigos Ned (Jacob Batalon), Flash (Tony Revolori), MJ (Zendaya) e Betty (Angourie Rice) continuam a enfrentar os desafios do colegial, ganhando uma viagem para a Europa de férias logo que as coisas com os desaparecidos se resolvem. Classe média sofre!

Happy, MJ, Flash, Betty e Ned

O que não deu para entender é se TODOS os amigos de Parker também foram “blipados” com ele, pois o único que cresceu parece ter sido o personagem Brad de Remy Hii, que é lembrado por Ned como um pirralho do fundamental antes do “blip”.

Happy e (eu te a) May

Enquanto um clima de azaração parece rolar entre May (Marisa Tomei) e Happy Hogan (Jon Favreau), Peter continua levando sua vida heroica, agora com o consentimento de sua tia. Mais em evidência que antes, ele faz aparições públicas no início do filme com o traje Aranha de Ferro usado em Guerra Infinita e Ultimato, ganhando vários fãs (entre eles Flash Thompson, que odeia Peter Parker). Antes da viagem para a Europa, Happy o avisa que Nick Fury (Samuel L. Jackson) está tentando contato com ele, mas o garoto evita o super-espião, partindo com os amigos de avião e deixando os trajes de herói em casa (Bem, quase todos!).


Já na Europa, enquanto o rapaz procura se aproximar de seu interesse amoroso MJ, planejando um encontro romântico com ela na Torre Eiffel, Peter se vê tendo que disputá-la com Brad, o que cria situações muito engraçadas no decorrer da história. 


Antes de ir para Paris (o que acaba não acontecendo), eles fazem a primeira parada na Itália, onde o grupo de amigos e os dois professores encarregados da turma se veem sob ataque de um imenso Elemental de água. Sem seu uniforme, Peter se vê sem alternativas para impedir que o monstro destrua Veneza, e é quando um novo herói surge em meio a batalha, disparando rajadas místicas dos punhos e voando em direção a criatura. Após deter a ameaça, o novo herói alado parte, agradecendo a ajuda de Peter (que entra em ação com uma máscara de carnaval cobrindo o rosto), e os amigos do rapaz apelidam o samaritano de “Mystério”. 


De volta ao hotel onde está hospedado com os amigos de escola, sem querer, Peter acaba recebendo a visita de Nick Fury, que pede sua ajuda com uma nova ameaça que ele vem rastreando desde o México. Lá, ao lado de Maria Hill (Cobie Smulders), o diretor da SHIELD acaba topando pela primeira vez com o Mystério que entra para o time alegando que não é do mesmo universo (o 616) que o Aranha e Nick Fury. 


Convencido a dar uma olhada na situação, já como Homem Aranha, o rapaz visita uma base secreta da SHIELD, e lá descobre que o Elemental da água é apenas um de outros três que atravessaram as realidades e que destruiu o universo de Quentin Beck (Jake Gyllenhaal), o Mystério. Com medo de expor sua dupla identidade agindo como o Escalador de Paredes na Europa, o Aranha recusa ajudar Fury e Beck, e decide voltar a sua identidade civil, para junto dos amigos.


Fury acaba manipulando a situação, e faz com que a excursão dos estudantes vá exatamente para onde será o epicentro do ataque do próximo Elemental, frustrando Peter. Em posse de um óculos dotado de uma IA chamada EDITH, último presente de Tony Stark ao garoto, entregue por Fury, Peter acaba se envolvendo em uma confusão envolvendo drones de ataque com tecnologia Stark, o que coloca a vida dos amigos dentro de um ônibus à caminho de Praga, em perigo. Apesar de cômica, essa sequência mostra a irresponsabilidade de Peter em lidar com a tecnologia de realidade aumentada dada por Stark para que ele se torne “o novo Homem de Ferro”. 


O filme nos passa a sensação de que o Aranha deve ser o substituto imediato do Homem de Ferro, o que acaba irritando um pouco. Se sentindo indigno de portar tal responsabilidade, Parker encontra em Quentin Beck, devido sua experiência em combate e conhecimento tecnológico, um substituto à altura de Stark, e decide presenteá-lo com EDITH, distorcendo o último desejo de seu mentor.


PAM, PAM, PAAAAAAM!

Para surpresa de ninguém que já leu alguma HQ, o cara da cabeça de aquário se mostra ser um vilão logo que põe a mão em EDITH, tecnologia que ele já almejava há muito tempo, e em poucos minutos de cena ele destrincha todo seu plano de conquista, junto com a sua equipe que é inteiramente formada por ex-funcionários da Stark Industries, frustrados com o ex-patrão. Assim como o Abutre (Michael Keaton) de Homem Aranha – De Volta ao Lar, o Mystério é mais um inimigo do Aranha ressentido pelo intelecto do homem por trás da armadura do Homem de Ferro. 


É bem criativo mostrar através do roteiro que “os poderes” que o Mystério usa para combater os Elementais na Europa nada mais são do que ilusões e projeções criadas pela tecnologia BARF que Tony Stark demonstra logo no começo de Guerra Civil, com a cena em que Robert Downey Jr. aparece rejuvenescido para mostrar o dia em que ele se despediu dos pais. 


Nem depois de morto Stark para de fazer merda, criando praticamente 80% dos vilões do MCU! A lista não para de crescer!


Longe de Casa é um filme extremamente carismático e divertido, que usa muito bem a interação do personagem principal com seus coadjuvantes. As peripécias de Peter para conquistar MJ, e ao mesmo tempo evitar as investidas do conquistador Brad sobre ela, são muito boas. 


O casal improvável Ned e Betty (que nas HQs existiu de um jeito diferente e acabou quando Ned foi capturado e morto como o Duende Macabro) também é uma das agradáveis surpresas do enredo, e funciona bem demais num contraponto com os desencontros entre Peter e MJ. 

O casamento de Betty e Ned nas HQs e a sombra do Duende Macabro

Enquanto o amigo se dá bem com Betty logo em seu primeiro "encontro", Peter tem que suar muito para conseguir dizer a garota tudo que ele sente por ela.


Mystério é muito bem interpretado por Gyllenhaal e todo o talento do ator fica evidente quando sua persona muda do herói para o vilão em poucos minutos. Apesar de seu plano tosco de ser visto como o novo herói do pedaço usando a tecnologia que, segundo ele, foi roubada por Stark, Mystério chega a soar plausível quando utiliza suas ilusões, se tornando um adversário difícil de ser combatido pelo Aranha. 


A sequência em que Beck ilude o Aranha criando um falso Nick Fury e uma falsa Maria Hill e o faz cair em várias armadilhas visuais, culminando num ATROPELAMENTO DE TREM é extremamente angustiante. Assim como o Escalador de Paredes, nós os espectadores, também não sabemos diferenciar o que é real do que é ilusão.


Nas HQs, tanto o Aranha quanto o Demolidor, que também se torna um adversário recorrente do vilão, enfrentam o Mystério utilizando seus demais sentidos, não confiando em sua visão (até porque para o Demolidor isso seria meio difícil, né!). 


Assim, os roteiristas apresentam o “Arrepio do Peter” (Sentido de Aranha), que foi brevemente mostrado em Guerra Infinita, de forma efetiva, o que o herói aprende a utilizar como recurso contra um cara que usa ilusões e drones como arma, para vencê-lo.


Zendaya é a nova queridinha de Hollywood, mas em cena ela não mostra muito porque é tão querida ou porque é tão requisitada (ela estava bem cotada para ser a Ariel de A Pequena Sereia antes do papel cair no colo de Halle Bailey). A ex-estrela da Disney não é tão carismática quanto Emma Stone em O Espetacular Homem Aranha, fazendo par com Andrew Garfield, por exemplo. A Gwen Stacy de Stone, além de bonita, é extremamente inteligente e carismática, e sua química com Garfield é uma das únicas coisas que se salvam nos dois filmes de Marc Webb.


Zendaya aparece bem pontualmente em De Volta ao Lar, mais como uma figura implicante para Peter Parker, já que o interesse romântico dele nesse filme é Liz (Laura Harrier), a filha de Adrian Toomes, e em Longe de Casa é exatamente essa característica mais “descolada” da menina que chama a atenção de Peter e Brad. A atuação da atriz é apenas “OK” quase sempre com sua expressão de "foda-se" no rosto enquanto encena, mas é difícil não cair de amores pela relação entre ela e Holland em tela, apesar de tudo, algo que é um ponto positivo, em detrimento do carisma de Zendaya (algo que Brie Larson nos provou em Capitã Marvel, ser somente um detalhe nas características principais de uma personagem feminina). A química dos dois funciona na tela, e isso que acaba importando no final. 


Sua MJ não é NEM DE LONGE a Mary Jane das HQs, mas para ESSE Peter Parker ela é uma parceira à altura, não sendo a mocinha em perigo irritante de Kirsten Dunst da trilogia de Sam Raimi e tão inteligente e safa quanto a Gwen Stacy de Emma Stone.

O traje do Macaco Noturno

Tirando o fato que mais uma vez a sombra do Homem de Ferro paira sobre o Homem Aranha durante o filme todo, incluindo a desnecessária cena em que Peter constrói DO ZERO um uniforme a bordo de um avião da Stark, Longe de Casa tem mais acertos do que erros. Apesar da luva com os dedos expostos do traje stealthMacaco Noturno” (deixando impressões digitais por toda a Europa!), a intenção de sua utilização é engraçada, e faz lembrar os momentos das HQs em que Peter tem que improvisar um traje quando o seu não está por perto. O que não vão faltar são bonequinhos desse filme para vender!



Nota: 8,0

P.S. 1- A primeira cena pós-crédito do filme abre de vez a questão da identidade já quase não tão secreta assim de Peter Parker. É irritante como os Homens Aranhas dos cinemas passam mais tempo sem máscara em cena do que com, mas se o plot aberto no final do filme tiver futuro no MCU, agora que ele nem vai mais precisar cobrir o rosto! A decisão final parece mais uma preguiça total de criar roteiros bem feitos com o herói tendo que se virar para esconder quem ele realmente é das pessoas que ele ama, protegendo-as de possíveis retaliações. Se o Homem de Ferro expôs logo quem ele era no primeiro filme, identidade secreta do Homem Aranha de cu é rola também!
Vale lembrar que nas HQs, quando Peter decidiu expor sua identidade para o público, deu UMA MERDA GIGANTE!


P.S. 2 – O que dizer sobre a participação super-especial de um certo editor de jornal rabugento que tanto os fãs esperavam desde Homem Aranha 3, hein?

P.S. 3 – Eu achei que a Invasão Skrull não ia acontecer, mas a segunda cena pós-crédito meio que inseriu o conceito da Invasão Secreta no MCU, mostrando o personagem Talos de Capitã Marvel se passando por Nick Fury. À partir de agora, qualquer um pode ser um impostor!

P.S. 4 - Segundo boatos de pessoas que assistiram o filme com o controle de pausa nas mãos (Hehehe!), a cena pós crédito em que o Aranha passeia entre os prédios está recheada de easter-eggs que indicam um possível futuro do MCU, incluindo a rua onde o Edifício Baxter do Quarteto Fantástico se encontra nas HQs e o futuro da antiga torre Stark, que como sabemos, foi vendida ainda em Homem Aranha - De Volta ao Lar. Teria Reed Richards adquirido o prédio para abrigar sua família fantástica?

Olha a antiga torre Stark sendo reconstruída lá atrás!

P.S. 5  (Vai ser caro PRA CARALHOOO!) - De acordo com boatos, o acordo entre Marvel e Sony pode acabar em definitivo caso Longe de Casa não atinja pelo menos US$ 1 bilhão de bilheteria. Se isso acontecer, uma terceira parte do Aranha junto aos personagens do MCU pode não rolar, e a Sony  pode voltar a fazer filmes merdas com o personagem. Mal podemos esperar para ver o Aranha lutando com o Venom do Tom Hardy! (NOT!!)

NAMASTE!

4 de julho de 2019

Review – X-Men Fênix Negra



A aquisição da 20th Century Fox pela poderosa Disney aconteceu durante a produção de X-Men – Fênix Negra, o que fez com que a estreia do mesmo fosse adiada por alguns meses. Não se sabe ao certo quais mudanças aconteceram no filme ou quais cenas tiveram que ser refilmadas, mas assistindo a bagaça, há uma nítida impressão de que no meio do caminho a Fox desistiu do projeto e mandou um “Ah, deixa do jeito que está!”.

No começo dos anos 2000 a Fox comprou os direitos dos mutantes da Marvel para fazer uma adaptação deles para os cinemas, e até então, NINGUÉM tinha feito absolutamente NADA minimamente assistível com os personagens famosos da Casa das Ideias. Blade (1998) tinha sido um “experimento” interessante, mas o caçador de vampiros estava longe de ser um personagem do alto escalão da editora. Os X-Men eram o principal ganha-pão da Marvel naquele período (após uma década de sucesso com os desenhos de Jim Lee, Rob Liefeld, os irmãos Kubert, Mark Silvestri e outros), e à beira da falência, a empresa se viu contra a parede, o que a fez liberar os direitos de seus bebês de ouro para estúdios de cinema, entre eles a Fox.


É inegável que sem a Fox, dificilmente teríamos o volume de filmes de heróis que temos anualmente. X-Men (2000) dirigido por Bryan Singer foi o pontapé inicial para a invasão “super-heróica” que se sucedeu na década seguinte, e tudo que foi experimentado ali, deu base para que diversos outros produtores e estúdios de cinema pensassem que aquela fórmula poderia dar certo. Não era o Wolverine de colante amarelo ou o Ciclope com suas tiras transversais e traje azul dos gibis que víamos na tela, mas mesmo com um orçamento modesto (US$ 75 milhões) a Fox nos fez acreditar que era possível levar personagens fantásticos dos gibis para as telas com um mínimo de fidedignidade. E não foi só o público que acreditou nisso! Alguns anos depois, estávamos vendo o Homem Aranha pulando de prédio em prédio pela Sony, o Hulk arrebentando tanques de guerra pela Universal e o próprio Quarteto Fantástico encarando o Doutor Destino também pela Fox. O sonho havia se tornado realidade.


Assim como nos gibis, os X-Men se tornaram rentáveis também nos cinemas, e o segundo filme, considerado o melhor da primeira trilogia e também dirigido por Singer, rendeu ao estúdio US$ 407 milhões (quase quatro vezes o orçamento), alavancando as carreiras de Hugh Jackman, Hale Berry (que já era oscarizada a essa altura dos fatos), Famke Janssen e do próprio diretor Bryan Singer. Não demorou para que o cara fosse contratado pela Warner para revitalizar a franquia do Superman, congelada desde o fracasso do projeto “Superman Lives”, ainda nos anos 90, e foi a vez de Brett Ratner dirigir a terceira parte da trilogia com a desistência de Singer. 

Bryan Singer e Brett Ratner

X-Men – O confronto final foi o primeiro sinal de que as coisas começavam a degringolar no estúdio, e apesar de faturar mais que seu antecessor (US$ 459 milhões), choveram críticas ao roteiro, as atuações e ao desfecho da história. 



O filme tinha o roteiro escrito por Simon Kinberg e Zak Penn, e tentou adaptar para os cinemas a famigerada Saga da Fênix Negra, nos quadrinhos escrita por Chris Claremont e John Byrne.


O carrinho da Fox começou a descer ladeira abaixo após a terceira parte de X-Men, e para não perder os direitos da franquia (que retornaria à Marvel em um período muito longo de inércia), os produtores decidiram contar uma história só com o Wolverine em 2009, algo que nem o mais incrédulo fã de quadrinhos poderia imaginar a bomba que seria quando o filme foi lançado. Vários problemas de bastidores envolveram a produção, incluindo aí refilmagens às pressas e vazamento do filme na internet sem qualquer efeito digital inserido, e por um bom tempo achou-se que a Fox não iria se recuperar do fracasso de X-Men: Wolverine Origens, o que a forçaria a devolver os direitos a Marvel.


Em 2011 a Fox, tal qual uma fênix, decidiu ressurgir das cinzas, e reformulou seu projeto com os mutantes, levando o enredo para os anos 60, no início da criação dos X-Men e o começo da amizade/inimizade entre Charles Xavier e Erik Lensherr


Saíam Patrick Stewart e Ian McKellen para a entrada de James McAvoy e Michael Fassbender nos papeis de Xavier e Magneto, o que acabou renovando todo o restante do elenco. X-Men: Primeira Classe perde a dependência de ter um Wolverine para que a história flua, e nesse retorno às origens dos filhos do átomo, a Fox conseguiu alavancar novamente os seus ovos de ouro nos cinemas. O filme dirigido por Matthew Vaughn e com produção de Brian Synger, Laura Shuler Donner e Simon Kinberg faturou US$ 353 milhões no mundo, o que foi suficiente para dar um novo fôlego a franquia e garantir o emprego de todo mundo envolvido.

Matthew Vaughn e Simon Kinberg

X-Men – Dias de um Futuro Esquecido foi lançado em 2014, e marcou o retorno de Bryan Singer a direção.


Tentando adaptar a clássica HQ homônima escrita por Chris Claremont, o filme serviu (além de trazer o Wolverine de Hugh Jackman de volta ao foco) para confundir AINDA MAIS a linha cronológica da franquia, que no início pretendia se manter coesa com a ideia de mostrar o passado dos personagens já usados na trilogia anterior. Numa viagem louca ao futuro e depois de volta ao passado, vemos um Bolivar Trask (Peter DinklageCOMPLETAMENTE diferente do apresentado em X-Men – O confronto final, lá vivido por Bill Duke, o que soa incoerente, já que as duas trilogias deveriam coexistir e não se anular. 


Para piorar ainda mais as coisas, ao final do filme, o Wolverine reencontra seus amigos vivos na Mansão Xavier, incluindo os que haviam sido erradicados por Jean Grey (Famke Janssen), o que nos diz que as ações de Logan no passado modificaram a linha temporal, anulando não só o futuro "esquecido" do título como também o que aconteceu em X-Men – O Confronto Final.


No filme seguinte, X-Men - Apocalipse, de 2016 as inconsistências temporais continuam acontecendo ao trazer um Anjo e uma Psylocke à trama (que se passa nos anos 80) ignorando completamente que eles já haviam aparecido em X-Men 3, ele adolescente e ela com uma idade próxima a que aparece em Apocalipse.


Mas Rodman, você acabou de falar que a história de X-Men 3 foi anulada! Segue o baile!

Pois é. Encaremos assim então.

Por incrível que isso possa parecer, X-Men – Apocalipse, que é com certeza o PIOR filme dessa segunda quadrilogia, rendeu aos cofres da Fox US$ 543 milhões, sendo o segundo filme mais rentável dos mutantes, perdendo somente para seu antecessor Dias de um Futuro Esquecido, que rendeu US$ 747 milhões. Embora Primeira Classe tenha sido uma revitalização meio tímida para a franquia, rendendo MENOS que sua tentativa anterior (Wolverine Origens faturou US$ 373 milhões), nota-se que houve um crescente no interesse do público, que voltou a acreditar nos X-Men nos cinemas, mesmo já se acostumando com os Vingadores e os demais personagens da Marvel Studios a cada três ou quatro meses na telona.

X-Men – Fênix Negra

Para quem quiser saber mais detalhes dos pontos que levantei sobre a franquia X de Wolverine Origens pra cá, deixarei ao final desse post links para os demais posts em que falo deles, por isso vou me ater a falar agora somente do último filme de X-Men produzido pela Fox.

Cara!

Que decepção!

Não é que eu esperava um “Vingadores Ultimato” para o desfecho de uma das franquias mais importantes para o cinema de super-heróis dos últimos (quase) vinte anos, até porque X-Men - Apocalipse já tinha acabado com minhas expectativas, mas cheguei a me sentir triste vendo o que Simon Kinberg (que assumiu a direção além do roteiro) acabou COMETENDO em Fênix Negra. Em primeiro lugar, é importante salientar que já era uma ideia imbecil requentar o plot mais batido da história dos X-Men nos quadrinhos que é o tema “Fênix” em MAIS UM filme. 


Não é possível que o próprio Kinberg não tinha aprendido com seus erros em X-Men 3 para querer repetir a dose alguns anos depois! Quando esse roteiro foi idealizado, quando a Fox ainda não tinha sido adquirida pela Disney, não teve ninguém que se opôs, meio que dizendo “Sério, cara? Fênix de novo? Já deu merda issaê. Não repete não.”? Gostaria de saber o argumento usado por Simon Kinberg, que está na produção desde a primeira trilogia, para levar os executivos a apostarem em uma história que JÁ TINHA SIDO CONTADA nos cinemas com um resultado meia-boca. Gostaria mesmo!


Seja como for, Kinberg apostou na força da história por trás da entidade cósmica que se apossa do corpo da jovem Jean Grey, agora colocando elementos mais próximos das HQs, o que tinha sido ignorado na trilogia anterior. Em X-Men 3, a Fênix é apenas um traço maligno da personalidade de Jean (Famke Janssen), bloqueada mentalmente em sua juventude pelo professor Xavier. Em X-Men - Apocalipse, quando Jean (Sophie Turner) ajuda Xavier a derrotar psiquicamente o vilão faraônico, algo parece querer dizer que a Fênix já faz parte da menina (como na trilogia anterior), tendo em vista que ela emana chamas e labaredas ao usar seus dons mentais.


Foda-se o que pareceu!

Em Fênix Negra, os pupilos de Xavier viajam para fora da Terra, à bordo de um Pássaro Negro mais tunado, a fim de salvar a tripulação de um ônibus espacial que está com problemas. 


Os X-Men agora são figuras públicas queridas e o Professor X tem uma linha direta com o próprio Presidente americano, o que faz com que eles cumpram missões a pedido do mesmo. 


Colocando sua vaidade em agora ser querido pela humanidade (estabelecendo seu antigo sonho de convivência pacífica entre humanos e mutantes) acima da segurança de seus alunos, Xavier ordena que o grupo resgate todos os astronautas da NASA quando um deles acaba ficando para trás, e é nesse ínterim, em que Jean é transportada para a nave por Noturno (Kodi Smit-McPhee), que a entidade Fênix a encontra e invade seu corpo, atraída por seu imenso potencial. 


Embora todos achem que perderam sua amiga após uma explosão, Jean retorna com Ciclope (Tye Sheridan), Fera (Nicholas Hoult), Tempestade (Alexandra Shipp), Mercúrio (Evan Peters) e Noturno para a Terra, liderados por Mística (Jennifer Lawrence)


Ao colocar a missão em risco, já que eles tinham poucas chances de alcançar o piloto deixado para trás antes de uma eminente explosão, Xavier, que estava na Terra, acaba causando um conflito com Mística, que o acusa e ameaça abandonar a liderança da equipe principal. A escola agora abriga diversos alunos mutantes, e os X-Men principais funcionam como uma força de elite para missões que exigem maior preparo. O Fera acaba convencendo Raven a ficar, mas a relação entre ela e Xavier fica abalada.


Após o incidente no espaço, os poderes de Jean Grey começam a apresentar instabilidade, e quando ela golpeia os amigos num surto psíquico durante uma festa em comemoração ao sucesso da missão, ela decide se isolar de seus amigos, e é quando os escudos psíquicos inseridos em sua mente por Xavier em sua infância começam a cair. Vendo o nível de seus poderes aumentar cada vez mais, Jean começa a se lembrar do acidente de carro que causou quando era criança com sua telecinésia, e que ocasionou na morte de sua mãe e o afastamento de seu pai. 


Para ajudá-la a superar o trauma, Xavier bloqueou as lembranças do acidente e escondeu o fato de que o pai da menina estava vivo. Assustado com o potencial destrutivo da criança, ele aceitou que Xavier cuidasse dela em sua escola, e em troca pediu que ela não o procurasse nunca mais. Quando essas lembranças voltam a ficar nítidas em sua mente, Grey enlouquece após confrontar o pai em sua casa, e acaba atacando os X-Men, o que causa a morte da Mística, numa cena sem impacto emocional NENHUM.


Após o sucesso meteórico de Jennifer Lawrence em Hollywood nos últimos anos, era no mínimo curioso que ela ainda aceitasse fazer parte do elenco da franquia X à partir de X-Men - Apocalipse, e a meu ver, era quase impossível que ela aceitasse reviver sua Mística em mais um filme. Uma de suas exigências para voltar era que Simon Kinberg dirigisse o quarto filme (indicando aí talvez, algum problema com o polêmico Brian Synger, que havia sido DEMITIDO da direção de Bohemian Rhapsody por desentendimentos com o elenco e faltas sem aviso ao set), e pelas poucas cenas que filmou até a morte de sua personagem, percebe-se que nem ela estava mais com saco para interpretar a mutante azul.


Após a morte de Mística, começa então uma caçada a Jean Grey, que é apelidada pelos alunos da escola de “Fênix”. Ela procura o apoio de Magneto, que se encontra isolado em uma “fazenda” junto a mutantes que assim como ele, não querem compartilhar o convívio com humanos. A sua presença traz o exército para os portões de Magneto, o que o enfurece e o força a salvar os humanos da ira da Fênix. Mais tarde, após a partida da moça, Hank McCoy visita Erik e lhe conta que Mística está morta. Os dois se unem para caçar Jean, enquanto o professor Xavier e os X-Men tentam encontrá-la para oferecer ajuda. 


Em paralelo a isso, uma raça de alienígenas que vem a Terra em busca da Fênix (entidade cósmica que destruiu o seu planeta), também começa a perseguir Jean, e quando a líder dos aliens se apossa do corpo de uma humana interpretada por Jessica Chastain para se misturar as pessoas comuns, é dito que a mulher (denominada nos créditos do filme como "Vulk") quer roubar o poder da Fênix para tentar recuperar seu planeta (!) e levar de volta seus amigos dali.


Não há nada de novo ou surpreendente no roteiro simplório de Kinberg, o que não chega a ser um demérito, já que filmes com roteiros MUITO mais fracos as vezes rendem boas horas de aventura e ação, o que também não é o caso de Fênix Negra. Tirando a própria Jean Grey e o Professor Xavier, nenhum outro personagem parece importar realmente ao enredo, e todos eles servem como coadjuvantes (quase figurantes!) no desenrolar do filme, incluindo a antagonista Vulk, que é quase tão fraca em motivação quanto o Apocalipse da produção anterior. 


Não é nenhuma surpresa nisso, já que o personagem sempre foi tratado como um qualquer nos cinemas desde a primeira trilogia em que era interpretado por James Marsden, e mais uma vez o Ciclope não passa de um bocó chorão que em nenhum momento toma as rédeas da história para si. Nem seu relacionamento com a protagonista rende a ele grandes momentos, e numa equipe em que Fera e Mística estão ausentes, em campo ele continua sendo comandado pelo Professor, o que nas HQs jamais aconteceria.


Scott Summers foi treinado desde jovem para se tornar um líder por Xavier, e em campo, ele sempre liderava a equipe, por mais que suas ordens desagradasse o restante do grupo, ocasionando conflitos entre ele e Wolverine e com a Tempestade. O Ciclope de Tye Sheridan não possui carisma, e aquela faísca que vemos de motivação e rebeldia que há dentro dele quando entra para a equipe em X-Men - Apocalipse se esvai completamente nesse filme.


Nenhuma inovação é desenvolvida também para a utilização dos poderes de Noturno e Tempestade enquanto eles enfrentam os alienígenas sem nome na tela, e ficamos com aquela sensação de mais do mesmo. Com poucas falas e nenhuma que seja emblemática, a Ororo de Alexandra Shipp chega a ser ainda mais decepcionante que a de Halle Berry, o que já era frustrante para quem lia os X-Men nos anos 80 e 90. A personagem que tomou a liderança dos X-Men do Ciclope NA PORRADA numa época em que ela estava SEM PODERES ainda não foi adaptada para os cinemas, mas continuaremos esperando.


Eu tenho dito isso ultimamente e me tornado até repetitivo, mas filmar cenas de ação empolgantes envolvendo super-heróis é algo que os Irmãos Russo aprenderam a fazer muito bem desde Capitão América – Soldado Invernal, mas que poucos diretores têm tomado como lição. No próprio universo da Fox, David Leitch (de Deadpool 2) é um cara que já se mostrou incrivelmente competente em mostrar a arte da pancadaria de forma gráfica nas telas, e é um exemplo de diretor que podia ter sido ao menos consultado para as sequências chatas e sem criatividade de batalha em Fênix Negra

David Leitch e os Irmãos Russo

A maioria dos conflitos se resume a atores com mãozinhas esticadas à frente do corpo fazendo caretinha pra emular poderes infinitos, mas com efeitos práticos pouco convincentes, e quando o pau precisa comer, o máximo que vemos é aquele Fera digital de Nicholas Hoult pulando amarrado em um arame e rugindo sem nenhum impacto. A gente vê essa mesma cena desde X-Men 3, e ela não é boa! Pelamordedeus! 


Pra não dizer que tudo é horrível em matéria de ação, o uso dos poderes de Magneto continuam sendo bem explorados. A cena em que ele arranca um vagão do trem e esmaga vários alienígenas dentro dele representa bem o que seria um Magneto na vida real.


X-Men - Fênix Negra é uma despedida triste para a franquia X na Fox, e ressalta mais erros do que acertos. O filme não serve nem para corrigir as linhas temporais entre a primeira trilogia e essa quadrilogia, e meio que abandona os personagens em um capítulo que parece um recado da Fox para a Disney: Toma aí que agora essa pica é tua, aspira! 



Em meio a cenas de ação decepcionantes, vilões mais que genéricos com motivações pífias e momentos emocionais broxantes, a única coisa que se salva mesmo é a atuação da maioria do elenco. Sophie Turner, que começou a atuar bem novinha em Game of Thrones, chegou a ser criticada em começo de carreira por supostamente não ser uma boa atriz, o que lhe ocasionou um início terrível de depressão. 


Ainda esperamos vê-la em papeis mais densos e que exijam mais de suas capacidades interpretativas, mas ela conseguiu ser bem convincente como a poderosa Fênix Negra, nos fazendo nos importar com seu personagem mesmo que minimamente. 


McAvoy e Fassbender, as grandes surpresas da nova quadrilogia, e os caras que carregaram a franquia nas costas (deve ser por isso que o Xavier de McAvoy acaba indo parar em uma cadeira de rodas!!) ao longo dos anos, mantêm a regularidade nesse filme, o que nos faz ter algo bom para se lembrar. O Magneto de Fassbender foi com certeza o ponto alto de todos os quatro filmes, e numa transição de universos da Fox para a Disney e Marvel Studios, seria muito bom poder contar com ele de volta ao papel, o que óbvio, não vai acontecer.


Nas palavras do próprio Kevin Feige, o dono da porra toda na Marvel Studios, os X-Men ainda vão demorar a dar as caras no universo de Vingadores, mas o estalar de dedos de Thanos em Guerra Infinita com muita precisão pode ser usado como brecha para os multiversos, o que deve ser melhor explicado em Homem Aranha - Longe de Casa, que estreia em breve. Ainda na linha "X", o filme dos Novos Mutantes que já foi adiado pelo menos umas três vezes ainda pode ser lançado qualquer dia desses, mas sinceramente, alguém ainda espera algo minimamente positivo disso?

Nota: 7

P.S.: A cena easter-egg com a presença da Cristal em seu visual clássico "disco" em meio a festinha na floresta foi bem bacana.


P.S. 2: O nome do grupo que aprisiona os X-Men após a caça a Fênix é "MCU", uma alusão ao próximo destino dos mutantes.

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NAMASTE!

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