1 de abril de 2018

Vocês lembram dos seus brinquedos de infância?



Estamos no século vinte e um e isso significa que estamos rodeados de tecnologia. Não como sonhávamos talvez, nada de carros voadores, teletransportadores ou raios lasers portáteis, mas já temos realidade virtual, internet na palma da mão (no smartphone, claro) e todo tipo de videogame para nos entreter e nos manter longe da vida real por longas horas. Mas... Vocês se lembram dos seus brinquedos de infância?

Metade dos meus brinquedos eu herdei do meu irmão mais velho. Como era naquela época, ele teve que abandoná-los cedo devido os estudos e o trabalho, e eu... Bem... Eu brinquei com seus bonecos por ele.

Eu sempre fui uma criança tímida e introvertida, o que dificultava MUITO a interação com outros seres humanos. De qualquer espécie. Eu morei até os seis anos no centro de São Paulo, e depois disso minha família se mudou para um município mais afastado dessa área, quase no meio do nada, quase longe de tudo. Não haviam vizinhos da minha idade, meus colegas de escola moravam longe e mesmo que morassem perto eu não os visitaria. Timidez, introspecção, etc. Diferente do que ela havia sido com meus dois irmãos mais velhos (aquele que mencionei antes e uma irmã), minha mãe decidira se tornar muito rígida quanto a liberdade dos dois filhos mais novos (eu e minha outra irmã mais nova), o que fez com que eu me sentisse “confortável” com minha introspecção. Anos 90, gente! Não haviam videogames (pelo menos não para mim), celulares ou todas essas coisas que nos tornam os “autistas sociais” que nós somos atualmente. Eu não podia escrever em “blogs”, “redes sociais” ou usar aplicativos, então eu tinha os meus brinquedos herdados. Vocês se lembram dos seus brinquedos de infância?


Apesar de todos esses problemas de comunicação, eu possuía uma mente muito criativa, e como eu passava muito tempo comigo mesmo, ouvindo meus pensamentos e criando minhas histórias, eu usava meus bonecos para exteriorizar aquela criatividade, o que fazia deles meus únicos amigos reais. Eu tinha um punhado deles. A maioria era sem articulação alguma, daqueles soldados que se mantinham em pé com o auxílio de “pranchas” coladas em seus pés, motoqueiros que mesmo quando desciam de suas motos NUNCA desdobravam suas pernas ou cavaleiros que quando desciam de seus cavalos também não saíam de suas posições. Aqueles que possuíam articulação nas pernas e nos braços, claro, eram os astros das brincadeiras, sempre os “atores” principais, os heróis, os mocinhos, aqueles que salvavam o dia.


Eu me lembro que naquela época o tempo demorava para passar, e num mesmo dia dava para criar várias histórias diferentes e encená-las uma após a outra em cima da cama de casal de minha mãe. A maioria das brincadeiras rolavam ali. Às vezes, quando a aventura era aquática, dava para arriscar brincar no tanque da casa ou na pia da cozinha, mas claro que rolavam os gritos lá de dentro:

“Para de gastar água!”

“Vai ficar gripado mexendo com água desse jeito!”.

O quintal possuía um espaço amplo, vegetação e muitas pedras, mas as brincadeiras ali eram quase proibidas. Eram as minhas regras. Não se leva seus amigos para um local onde eles podem se perder e talvez nunca retornar. Nunca se abandona um amigo.

Com o passar do tempo, além do roteirista de minhas histórias em cima da cama da minha mãe, eu também me tornei o diretor das cenas, o sonoplasta e também o “voice-actor”, já que eu dava voz para todos os personagens. O dia não podia terminar enquanto a aventura não estivesse concluída, e antes que chegasse a hora de tomar banho, o herói precisava ter vencido o vilão, e todos precisavam sair comemorando. As “gravações” no “set de filmagem” eram sempre com um prazo apertado!

Meus atores já eram veteranos. É sério! Por serem herdados, alguns possuíam em suas costas, dez e até quinze anos de uso. Alguns estavam quebrados, outros levavam marcas de mordida de cachorro pelo corpo, outros estavam apodrecendo sozinhos e alguns haviam sofrido acidentes terríveis. Ninguém ali era novato, mas eu sabia que eles ainda aguentavam o tranco, já que sua missão ainda não estava completa. Eu ainda precisava MUITO deles. Eu tinha roteiros e mais roteiros em minha cabeça e eles precisavam me ajudar a concretizá-los, e assim aconteceu por alguns anos.

Hoje nós temos action figures de todos os tipos e modelos, mas a grande maioria delas emula personagens famosos da cultura pop. Alguns são ajustados para caber na palma da mão, outros são gigantescos, outros não possuem articulações (mas esses são artigos de luxo agora!) e só servem para enfeitar, mas a variação é bem grande. 


Os meus amigos não tinham nome e nem identidade de fábrica. A maioria deles. Eu tinha o “policial”, o “soldado”, o “motoqueiro” e eles eram nobres desconhecidos, o que acabava sendo bom, já que eles se tornavam “atores” flexíveis, podendo interpretar qualquer papel. Além do que eu podia batizá-los com os nomes mais ABSURDOS que vinham em minha cabeça!

Quase todos os bonecos tinham nomes próprios dados por mim, exceto aqueles que representavam algum personagem famoso como o Homem de Ferro (da coleção da Gulliver, sem articulações e com uma cor só, no caso prata), o Superman (numa posição de voo, SEM capa e também numa cor só, o azul) e o Zorro... Eu tinha uns seis “Zorros”, todos coloridos, sempre na posição de montar no cavalo e com capa removível. Cada Zorro tinha um nome diferente, “Bruce”, “Rafael”, “Douglas”...

Eles eram do meu irmão também, e a dupla de Playmobils vieram no pacote de herança. Um amarelo e um azul (depois alguém me deu outro azul na escola!). Eles tinham alguns apetrechos que serviam em suas mãos de gancho, e isso ajudava bastante nas brincadeiras. Eles seguravam garrafas (as vezes as brincadeiras acabavam em bebedeira!), facas, raquetes de tênis e outros itens inclusos, mas o que eu mais acabava usando era a metralhadora. O “Roger”, o Playmobil amarelo, adorava dar uns tiros, e em geral ele acabava sempre sendo o cara durão dos enredos.


Um dos bonecos que eu mais gostava era o Alex. Eu não faço ideia o que ele era originalmente, nem o que ele foi destinado a ser ou de que coleção ele pertencia, mas ele era um dos únicos articulados que eu tinha (dobrando joelhos e cotovelos), além do que ele possuía um rosto bem esculpido, o que fazia dele o “galã bonitão” das aventuras, o herói. Quando eu encenava alguma história de personagens existentes, via de regra o Alex se tornava o Peter Parker, o Clark Kent ou o Steve Rogers, quando o herói não estava em missão, em sua identidade civil. Quando a pancadaria tinha que rolar e os demais bonecos precisavam de algum perito em artes marciais, adivinha quem era o cara?


“Robson Robô”, “Rafael” (agora que me liguei que eu tinha dois bonecos com o MESMO nome), “Mágico”, “Porcão” e “Palhacinho” eram alguns dos nomes dos demais bonecos. Esses em geral eram escalados para serem os vilões, não sei explicar porque, mas quase nunca eles se davam bem nas aventuras. O Rafael parecia ser um fisiculturista que usava uma tanguinha vermelha ridícula e que era o desafeto principal do Alex. Robson Robô (de onde eu tirava esses nomes?!) era escalado para viver qualquer robô do mal (as vezes ele era o meu Doutor Destino também!) e o Porcão... Era claramente uma Tartaruga Ninja com roupa de férias, e com jeitão simpático, mas que servia de brutamontes dos inimigos, já que ele tinha uma proporção um pouco maior que seus colegas de elenco.

Eu citei que eu emulava alguns personagens existentes, cansei de brincar de Jaspion (eu tinha o meu próprio metal-hero, o Super Rod), de Changeman e super-heróis dos quadrinhos também. Tudo que eu assistia na TV acabava servindo de inspiração para as brincadeiras, e não era raro eu simular o Batman de ’89 usando o um dos Zorros como o Homem Morcego (e eu nem sabia que o Zorro havia servido de inspiração para a criação do Batman, ora só vejam vocês!), de Superman contra o Homem Nuclear de “Em Busca da Paz” com meu Superman azul “congelado” ou de Vingadores. Eu tinha vários gibis empilhados em caixas, e muitas histórias serviam como base para as minhas aventuras. Os meus Vingadores se chamavam Defensores, e os meus Heróis Mais Poderoso da Terra reuniam o que dava para criar na hora, um Capitão América improvisado com um dos motoqueiros que eram bem versáteis (com braços e pernas flexíveis) segurando uma tampa de um ioiô como escudo, um Homem-Elétrico interpretado pelo Alex, um Namor representado pelo Rafael fisiculturista, uma Feiticeira Escarlate interpretada por um Zorro vermelho de capa de mesma cor (sério! A gente tinha que improvisar!) e o Homem de Ferro prateado que não tinha nenhum dos pés e uma das mãos, comida por um cachorro nosso. Vergonha? Nenhuma! As histórias rolavam tranquilamente com direito a muita ação, drama e reviravoltas de roteiro impressionantes.


Como eu disse anteriormente, meu irmão mais velho havia sido o dono de grande parte daqueles brinquedos, mas um que ele mantinha guardado como uma relíquia era sua Supermáquina e seu piloto Michael Knight, da série homônima da TV. Me lembro até hoje do dia em que ele ganhou aquela Supermáquina de presente, foi o mesmo dia em que eu ganhei meu Bat-Robô, uma pick-up verde que movida à fricção se tornava um robô de braços levantados quando ele batia em uma parede. 


Era um carrinho legal, serviu como meu Daileon por muitos anos, mas claro que para mim, como criança, não chegava aos pés daquela Supermáquina. As brincadeiras eram sempre especiais quando dava para incorporar o Michael Knight, que na época, era o boneco mais legal de todos. Apesar de ser numa escala um pouco maior que os demais, ele era todo articulado e ainda tinha seu próprio carro! Se eu tivesse bonecas ali no grupo, o Michael com certeza faria sucesso entre elas!


Alguns anos depois a minha madrinha me presenteou com um boneco que podia rivalizar com o Michael Knight de meu irmão, e eu passei a ter um brinquedo maneiro em mãos também, o B.A. do Esquadrão Classe A. Curiosamente os dois bonecos vinham da mesma coleção da Glasslite, que naquele ano tinha produzido brinquedos da Supermáquina, Esquadrão Classe A e Duro na Queda, séries de sucesso que passavam na Globo nos anos 80. O B.A era meu boneco mais fodão, e quando ele entrava na parada, não sobrava para ninguém.


As brincadeiras que eu mais gostava e que mais rendiam histórias eram as de ação. Eu podia passar horas seguidas fazendo sons de socos, chutes, disparos de energia, chocar de espadas e perseguições de carros e motos, mas por um longo período, já no avançar da adolescência, eu comecei a me dedicar aos esportes.

Eu já gostava de jogar botão na mesa de casa, inventar campeonatos malucos onde a Seleção Brasileira enfrentava o Milan (!!) por exemplo, mas apesar de imaginar que os jogadores estavam ali trocando passes, eu sentia que faltava algo. 


Quando eu percebi que daria para emular campeonatos de futebol muito mais emocionantes com meus bonecos, eu posicionei as duas traves uma em cada lado da cama de minha mãe, separei meus bonecos por cores para montar os times e coloquei a bola para rolar (eu cheguei a ter DOIS minicraques da Coca Cola!). Diferente do botão, era possível simular dribles, defesas incríveis, troca de passes dinâmicos e eleger meus artilheiros. O negócio era tão sério que eu marcava o tempo certo no relógio e anotava num caderno os resultados. Tinha até controle de artilharia e somatória de pontos no campeonato. A narração? Claro, eu fazia, assim como o apito do juiz, o som da torcida imaginária e o barulho do chute na bola. Me lembro que esses campeonatos de futebol marcaram por serem minhas últimas brincadeiras, quando então, apesar de gostar muito daqueles carinhas de plástico, já não era mais tão emocionante brincar com eles. Eu já revezava meu tempo entre desenhar minhas próprias histórias em quadrinhos e escrever meus contos de ficção, e com o passar do tempo eles começaram a ficar esquecidos dentro do armário. Era triste tirar todos eles do lugar, preparar armamentos, veículos, montar cenário com caixas de sapato, ter em mente a história e logo no começo já perder a vontade... Sentir vergonha por estar ali fazendo sons bobos com a boca e gritando e encenando diálogos estúpidos. Quando isso começou a acontecer com maior frequência foi a hora que saquei que já não tinha mais idade para aquilo. Era hora de abandonar meus amigos. Os únicos amigos que eu tive por um longo tempo. O que eu tinha esquecido é que não se abandona um amigo.

A infância que tive serviu para construir o adulto que sou hoje, infelizmente alguém cheio de inseguranças, neuras e que me impede de me relacionar corretamente com as pessoas. Talvez eu tenha brincado até demais com meus amigos de plástico, e que eu tenha essas lembranças boas daquela época porque eles me ajudaram com minha solidão. Eu não me sentia sozinho. Eles estavam sempre ali para quando eu precisava. Eles nunca se negaram a participar das aventuras por mais estranhas ou perigosas que pudessem parecer na hora, e eles serviram seu papel. Mesmo quebrados, despedaçados, sem braço, faltando pedaços, eles foram os melhores amigos que uma criança solitária podia ter, e por isso doeu muito quando eles partiram.


Eu já era adulto quando numa tarde qualquer eu tive a ideia de rever meus amigos. Depois de tantos anos, eu sabia que eles estavam guardados dentro de uma sacola numa caixa de papelão na casa adjacente a da minha mãe. As duas casas eram no mesmo quintal, e nessa outra ficavam guardadas as quinquilharias, grande parte das coisas da infância, minha e de meus irmãos. Nessa casa estavam caixas com os livros de escola, cadernos, bolas murchas, jogos de tabuleiro (aqueles que viam com as embalagens de chocolate) e até as bicicletas. Guardados em uma caixa, eu sabia que podia encontrar meus brinquedos. Eles estiveram ali por anos. Por que não estariam agora? Me lembro que procurei por toda parte e não encontrei a sacola onde eles deveriam estar. Tirei tudo do lugar e não os encontrei. Não havia outro lugar onde eles poderiam estar, até que veio a triste constatação:

“Que brinquedos? Só tinha uma sacola cheia de lixo. Pedaços velhos!”

Minha mãe havia jogado fora a sacola com os brinquedos, achando que se tratava de resto de alguma coisa, e não havia percebido que lá dentro, junto aos pedaços de brinquedos quebrados, estavam também os meus amigos de infância. Eu senti raiva na hora, fiquei revoltado e depois me bateu uma tristeza profunda. Eu sabia que deveria tê-los tirado de lá em algum momento, cuidado para que eles não fossem confundidos com lixo antes do que aconteceu, mas os anos fizeram com que eu me esquecesse deles. Eu já trabalhava, pagava minhas próprias contas e não tinha mais tempo para brinquedos antigos. Por algum tempo eu esqueci dos meus bonecos e os abandonei. Quebrei a promessa.

Um ou dois anos antes dessa história, eu “reuni” todos eles e tirei essas fotos que ilustram esse post. A qualidade não é grandes coisas porque eu só tinha uma daquelas câmeras digitais para fazer isso, e alguns dos personagens citados aqui nem sequer aparecem na foto. Tenho saudades às vezes daquele tempo e me lembro com carinho de cada um deles. Não é difícil também eu sonhar às vezes que encontrei meus bonecos e que eles estiveram guardados em algum canto esse tempo todo. De tudo que citei aí, ainda tenho a Supermáquina do meu irmão e alguns dos demais carrinhos que serviam para as perseguições, mas todo o resto se foi. B.A, Michael Knight, Alex, Roger, Robson Robô... Tudo que tenho deles hoje são essas fotos e as lembranças daquele tempo inocente e triste.

Acho que o trauma foi tão grande em perdê-los, que depois de alguns anos eu acabei comprando algumas Action-Figures meio que pra suprir aquele vazio, incluindo um Clubber Lang, personagem do filme Rock III interpretado pelo ator Mister T, o mesmo que fazia o B.A. em Esquadrão Classe A. Eu cheguei a pesquisar no Mercado Livre por ele e pelo Michael Knight da Glasslite, mas por mais que eu comprasse outros, eles não seriam os mesmos que eu brinquei, além do que não teriam seus companheiros de aventura com eles.


Embora todos nós tenhamos que crescer um dia, para alguns de nós essa passagem para a vida adulta acaba sendo mais traumática, e se a sua infância não foi bem vivida, você acaba se tornando um adulto amargo e cheio de problemas emocionais. Alguns anos depois eu conheci a trilogia Toy Story que conta a aventura de bonecos que ganham vida quando seus donos não estão prestando a atenção, e o terceiro filme me marcou de um jeito muito forte, pois fala justamente dessa hora da despedida, em que Andy, o dono dos bonecos, precisa se tornar um adulto e abandonar seus amigos. Choro copiosamente todas as vezes que assisto esse filme, e dificilmente isso vai mudar algum dia.

E vocês? Se lembram dos seus brinquedos de infância?

NAMASTE!

3 comentários:

  1. Uaaal,que escritor foda você, te admiro muito parceiro,que tenha muito sucesso na vida e saiba que seus amigos de infância nunca vão te esquecer,vai entender se já assisti Toy Story

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  2. Poxa mano eu não sabia que o Michael Knight tinha ido para o lixo! E sinceramente não lembrava do episódio com os demais. Esqueceu de citar as vezes que eu participei das brincadeiras do Mágico Maravilha (Mistura de Hebe com Elke Maravilha?) "Um beijo na bunda e até segunda"! Não citou a Andreia irmã do Roger (o outro esqueci o nome...), é verdade não é que tinham dois Rafael? Também parciticei dos campeonatos de botão. Era legal apesar de triste e solitário e de termos nos transformado em dois bichos do mato que as pessoas rejeitam no fim das contas. Dois bichos criativos para car@%&$.

    PS: a mãe também jogou fora as roupas das minhas bonecas (que ela mesma tinha costurado) e as "rodinhas", lembra? Beto, Bia e CIA? Isso dá outra longa história!

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  3. Cara, eu de novo (a mesma pessoa do primeiro comentário), tu é foda. Não consigo parar de ler seus posts, estou amando muitoo ��

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