No Combo Breaker dessa semana o Blog do Rodman vai fazer um jabá DE GRAÇA para o Disney Plus e falar de três filmes do catálogo da plataforma que vão disputar o Oscar 2021.
Sigam-me os bons!
MULAN
Há algum tempo os estúdios Disney vêm tentando adaptar suas animações clássicas para novos públicos, mas a cada novo lançamento, fica bem claro que é uma tarefa difícil agradar tanto aos fãs dos desenhos antigos quanto os novos. Com a estreia de Mulan em setembro (2020), não foi diferente, e o filme dirigido pela neozelandesa Niki Caro sofreu críticas duras até mesmo antes de seu filme dar as caras no serviço de streaming da Disney.
Em geral, o público que estava acostumado com a animação de 1998 torceu logo o nariz para as modificações anunciadas para o live-action e muita gente nem quis conferir o resultado. Entre as grandes alterações, constam a ausência do carismático Mushu — que no desenho funcionava como a voz da consciência da protagonista — e a adaptação do personagem Li Shang, o oficial comandante que acaba se apaixonando por Mulan enquanto ela ainda está disfarçada como um soldado do exército chinês.
Mushu e Li Shang |
No filme, os roteiristas optaram por dividi-lo em dois personagens distintos, um o Comandante Tung (Donnie Yen) que adota uma postura mais paternal com Mulan e outro, Honghui (Yoson An), que assim como ela, é um jovem recém-alistado no exército e por quem a garota acaba desenvolvendo certo afeto. Vale lembrar, que no desenho, Li Shang sempre foi visto como um símbolo bissexual forte, uma vez que ele já gostava de Ping (o nome que Mulan adota para ingressar como um homem no exército) muito antes de saber que ele na verdade era ela. Nem é preciso dizer o quanto essa decisão desagradou os fãs do original.
Apesar de todas as críticas quanto às mudanças — que não se limitam apenas a Mushu e Li Shang — o longa-metragem, que foi uma grande aposta da Disney para abraçar ainda mais o público asiático, funciona muito bem como um produto independente, se o desassociarmos da animação. A produção de figurinos, cenários e ambientação é impecável, além do que o trabalho de fotografia da diretora australiana Mandy Walker é bastante impactante em várias cenas, causando a imersão necessária para a história.
O elenco de Mulan também não decepciona, começando pela protagonista vivida por Liu Yifei que garante ótimas cenas de ação e transparece a bravura da sua guerreira chinesa. Yifei é mais comumente vista em produções asiáticas e chegou a fazer participações também na série Once Upon a Time. Em Mulan, a atriz de 33 anos não compromete em seu papel principal, mas fica bem óbvio que ela não convenceria ninguém se fazendo passar por um homem. Enquanto na animação a personagem passa por toda uma masculinização — sacrificando inclusive os cabelos longos — para poder substituir o pai na guerra, visualmente quase nada é alterado entre a Hua Mulan do filme e sua personificação masculina Hua Jun. Mesmo assim, isso não compromete a atuação de Yifei, que consegue fazer com que nos importemos com sua heroína ao longo de sua jornada, como diria a Lumena!
O elenco estelar de Mulan ainda traz o já veterano Jet Li na pele do Imperador chinês — e confesso que demorei para o reconhecer embaixo da indumentária pomposa —, o já comentado Donnie Yen como o Comandante das tropas chinesas, a atriz Gong Li como a bruxa Xian Lang — personagem que não existe na animação de 1998, mas que casou bem com o clima mais místico do live-action — e Jason Scott Lee que vive o antagonista principal do filme Bori Khan, substituindo o guerreiro huno do desenho Shan-Yu — apesar dos dois serem semelhantes em aparência.
Assim como a animação noventista, o longa Mulan é baseado livremente na história folclórica chinesa “A Balada de Mulan” e no original, a guerra da China não é contra os hunos — como vimos no desenho — e sim contra os invasores Rouran, cujo líder tribal é representado no filme pelo personagem de Scott Lee. A motivação de Khan em querer acabar com a dinastia chinesa no filme de Niki Caro também é bem mais plausível, já que ele faz tudo a seu alcance para vingar a morte do pai nas mãos do imperador e também para manter a terra e a cultura do seu povo, oprimido pelos chineses. Se a gente pensar bem… ele não está tão errado assim!
Quem não é velho como eu nem deve saber, mas Jason Scott Lee estrelou a primeira cinebiografia de Bruce Lee nos anos 90 (Dragão – A História de Bruce Lee, de 1993), e eu também demorei um pouco para reconhecê-lo no filme, agora no alto dos seus 54 anos. Estamos ficando velhos, Magneto!
Vale a pena assistir, Rodman?
Se você não é extremamente apegado à animação e quer ver um filme bacana com muita aventura e ação, além de curtir cenários maravilhosos da cultura chinesa, vale sim, jovem padawan! Mulan não é nem de longe tocante como o desenho — principalmente se compararmos o final apoteótico de uma China agradecida reverenciando a Mulan no final da animação —, mas traz bons questionamentos sobre a posição feminina numa cultura tão machista, embora esse tema esteja diluidíssimo em meio a efeitos visuais e cenas de pancadaria. A Mulan do filme não ser apenas uma mulher muito bem treinada que se equipare a homens em combate também diminui bastante a personagem e o apoio na muleta do domínio do “Chi” que ela possui desde criança a torna só alguém muito privilegiada que não se esforçou para ter suas habilidades. É como se a Mulan do live-action gritasse para o espectador:
“Se eu tenho o domínio do Chi e as outras pessoas não, É PORQUE EU MERECIIII! ”
Em tempos, ignorado completamente pelo Golden Globes, Mulan concorre a duas categorias no Oscar, o de Melhores Efeitos Visuais e o de Melhor Figurino, que tem tudo para levar para casa. Vamos ver se depois de tanta crítica, algum prêmio o filme leva!
Nota: 8
SOUL
Para mim, assim como para outros adoradores de animações, o selo “Pixar” vem acompanhado de uma expectativa imensa que só pode ser compensada com um balde de lágrimas que carregamos ao final da sessão de cinema. Pelo menos ao meu ver, tem sido assim desde Toy Story — menos o 4! —, passando por Wall-E, Ratatouille e chegando nos mais modernos como Divertida Mente e Viva – A vida é uma festa. A gente meio que se acostumou a esperar sempre o máximo de emoção num desenho animado do estúdio e não tinha como ser diferente com Soul, o que deixou um pouco daquele gosto amargo na boca.
Você quer dizer com isso que Soul é ruim, Rodman?
Não, nem de longe, caro padawan! A minha decepção com Soul tem mais a ver com a minha expectativa que estava no pico antes de eu começar a assistir do que propriamente com o desenvolvimento da história e dos personagens em si. Mas tentarei explicar.
Para começar, é bom lembrar que Pete Docter, o diretor do filme, não é nenhum iniciante e que tem no currículo além de Monstros S.A., os magníficos Up – Altas Aventuras e Divertida Mente, tendo ele ganhado o Oscar de Melhor Animação pelos dois últimos. Além da direção, Docter participou do roteiro de incontáveis outros sucessos da Pixar, o que o gabaritava imensamente para ser o grande cara por trás de Soul.
Soul é uma imersão psicológica bastante contundente não só ao nosso lado espiritual — e à primeira vista é muito fácil relacionar certos elementos narrativos com uma ou outra religião —, mas principalmente a nossos medos mais “modernos”. Apesar de ser uma animação que esteja ali para agradar também as crianças, a mensagem principal é sim para nós os adultos e quando mergulhamos na história, a mensagem nos pega de maneira firme.
No enredo, o personagem Joe Gardner (dublado por Jamie Foxx) é um professor de música frustrado que ainda busca um lugar entre os grandes musicistas de jazz da cidade, embora esconda um passado de rejeições que faz com que até sua mãe duvide de suas capacidades instrumentistas, embora ele as tenha. A realidade se mostra bem irônica, no entanto, quando sua grande chance de mostrar seu talento na banda da cultuada “jazzista” Dorothea Williams (Angela Bassett) acaba sendo frustrada por um acidente que encerra sua participação no “show da vida”. E não… isso não é spoiler. Tem até no trailer!
Sem conseguir mostrar do que é capaz para Williams na Terra, Joe embarca numa jornada desesperada para tentar voltar para seu corpo, mostrando a todos do lado de lá do desconhecido que ele não está pronto para morrer e que a sua missão ainda não terminou. Auxiliado pelos mentores espirituais denominados “Zé” — um deles dublado pela brasileira Alice Braga — e tendo que servir ele próprio como conselheiro da alma impetuosa 22 (dublada por Tina Fey), Joe acaba descobrindo que sua jornada nunca foi se tornar um músico prestigiado e sim aproveitar melhor as pequenas coisas da vida, sendo esse seu propósito específico.
E nesse ponto o filme me atingiu fulminantemente!
Não só pela pandemia, mas por diversos outros motivos, eu me tornei uma pessoa reclusa que simplesmente não vê mais significado na vida e que não acredita mais em “propósito” (falei um pouco disso aqui recentemente). Nesse quesito, Soul é brilhante, já que mostra ao espectador tanto na figura do Joe — o sujeito inconformado com a própria vida, aquele que acha que precisa de um sentido para viver — quanto na 22, que é uma alma que simplesmente se recusa a nascer em um corpo na Terra, não vendo nem sentido ou qualquer motivação para estar entre os mortais. Enquanto a convivência entre eles os ensina novas perspectivas — e também a nós que estamos assistindo sua aventura — o filme leva os personagens a diversos cenários oníricos e subconscientes, lidando muito bem com assuntos como depressão e ansiedade, dois males que nos acompanham diariamente nessa corrida constante da vida adulta para ser alguém.
Mas afinal… nós temos mesmo que encontrar nosso propósito ou basta vivermos um dia de cada vez, fazendo o máximo pelo nosso próprio bem-estar e daqueles a nosso redor?
Soul nos leva a essa reflexão e cada um acaba tendo sua própria resposta ao final do filme, enquanto os créditos sobem e as lágrimas escorrem dos olhos.
Apesar de toda essa carga emocional, ainda não considero Soul um dos melhores trabalhos de Pete Docter, mas talvez ele ganhe maior espaço em meu coração ao longo dos anos.
Soul disputa o prêmio de Melhor Animação no Oscar 2021 e já garantiu a Docter o Globo de Ouro na mesma categoria e também em Melhor Trilha Sonora. Para mim, apesar do filme deixar um pouco o tema música em segundo plano, eu acho que a trilha tinha obrigação de ser mais inspirada e impactante, algo como o excelente “Whiplash” — só pra ficar no tema jazz — que gruda suas músicas na mente mesmo horas e horas após a exibição. Mas quem sou eu para criticar os véi que premiam as categorias do Golden Globes, não é mesmo?
Nota: 8,5
DOIS IRMÃOS
Eu preciso admitir aqui que não tinha a menor vontade de assistir Dois Irmãos: Uma Jornada Fantástica (no original “Onward”) e que tinha agido SIM com preconceito quanto à temática da animação, bem como o visual dos personagens.
Aiiiiin, Rodman! Seu elfofóbico!
Me desculpem os elfos azuis que estiverem lendo esse post, mas eu tinha ligado o meu completo foda-se para a animação, até o momento em que começaram a chover críticas quanto a Soul ter vencido o Globo de Ouro de Melhor Animação no lugar de Onward. Naquele momento, eu que ainda não tinha visto Soul, percebi que para fazer um post mais abalizado de indicações ao Oscar, eu precisava assistir aos dois e tirar minhas próprias conclusões. E a verdade é uma só: ambos os filmes não se comparam.
Antes que facas e foices comecem a ser arremessadas, vale lembrar que as duas produções levam o selo Disney / Pixar, o que faz com que qualquer que seja o resultado de uma “briga” entre elas, o Mickey vai contar dinheiro do mesmo jeito! Em favor de Dois Irmãos, a pegada “Disney” na animação é mais notória, já que a aventura do subtítulo deixa bem clara que a história é sim mais leve e bem mais focada no público infantil do que Soul, por exemplo. É meio que querer comparar Shazam! da Warner, que tem uma cara mais infantiloide e bobalhona com a obra-prima da sétima arte que é Zack Snyder’s Justice League, o filme mais adulto de todos os tempos — e nem ouse discutir, padawan! Eu envelheci mais 15 anos só em assistir as quatro horas daquela porra!
Apesar de não serem histórias para um mesmo público, é inevitável não compararmos os dois filmes, já que ambos disputam o mesmo prêmio de Melhor Animação, e nesse quesito é bom referenciar aqui, me fazendo queimar bastante a língua e engolir a minha elfofobia a seco, que Dois Irmãos é sim mais divertido que Soul.
O que? Calúnia! Difamação, Rodman!
Onward é escrito e dirigido por Dan Scanlon, que diferente de Pete Docter, não tem um currículo tão impressionante, estando à frente anteriormente apenas do fraquinho Universidade Monstros, o prequel de Monstros S.A. Apesar da pouca experiência na direção, Scanlon entrega um filme bem redondo e de fácil digestão para o público, em especial por fazer com que nos importemos logo de cara com o personagem loser da vez dublado pela eterna viúva do “Senhor Stark” Tom Holland.
Num mundo mágico onde os seres que o habitam — além de elfos tem trolls, unicórnios, fadas e centauros — simplesmente deixaram de usar a magia pela conveniência das modernidades tecnológicas, no dia do seu aniversário de 16 anos, Ian Lightfoot (Holland) recebe da mãe Laurel (Julia Louis-Dreyfus) um presente que guardou por anos, dado pelo pai já falecido do garoto elfo. Segundo a carta deixada por ele, o artefato vai permitir que o antigo patriarca da família retorne para conviver com os filhos durante um dia através de magia. O presente em si é um cajado e as instruções deixadas pelo pai exigem que um dos meninos — Ian e seu irmão mais velho Barley, dublado por Chris Pratt — utilize a magia adormecida para trazê-lo dos mortos, o que obviamente dá errado num primeiro momento.
Tendo destruído no processo de ressuscitação a gema mística que seria usada como intermédio entre os mundos — e tendo trazido apenas a metade da cintura para baixo do pai de volta — todo o plot dos dois irmãos se desenvolve pela busca de uma outra “gema fênix” para trazer o restante do pai, o que faz com que eles partam numa jornada ensandecida pelo mundo místico que agora não é mais como antigamente.
Cheio de referências a jogos de tabuleiro de RPG, com uma trilha sonora recheada de Rock N’ Roll com orquestras e um humor muito característico, Dois Irmãos é com segurança a animação mais divertida que assisti nos últimos tempos e também um dos últimos filmes que consegui assistir de uma tacada só, sem nem me levantar para fazer qualquer outra coisa. A aventura dos irmãos Lightfoot é mesmo digna de ser acompanhada na íntegra e não causa nenhum sentimento de estranheza pela ambientação pouco comum daquele mundo fantástico representado na tela. A forma criativa como os roteiristas representam alguns seres místicos já tão inerentes no nosso imaginário popular é muito boa, e mesmo não estando nos melhores dias da minha vida, confesso que abri um sorriso com a gangue das fadas motociclistas. Outro ponto de risos contidos foi a performance a la “Um Morto Muito Louco” do patriarca dos Lightfoot, com suas dancinhas e seu gingado um tanto quanto etílico. Hilário!
Claro que por se tratar de uma história sobre paternidade, a emoção é garantida no desfecho do filme e toda a nossa apreensão pela conclusão ou não da jornada dos personagens é compensada brilhantemente com um final bastante tocante entre os irmãos e seu pai. A Pixar já tinha me feito chorar com um robô apaixonado em Wall-E, já tinha me arrancado lágrimas da interação de uma criança com seus brinquedos e tinha feito eu me importar com um rato cozinheiro… mas fazer eu me debulhar em lágrimas por causa de uma van É SACANAGEM! O sacrifício da Guinevere ao som de “Rise to Valhalla” é um dos momentos mais épicos do filme. Chorei e não foi pouco!
Vale lembrar aqui que muito da minha emoção com o filme se deu também porque eu perdi o meu grande amigo canino no começo desse dia e ainda estava bastante fragilizado emocionalmente. A recuperação tem sido lenta e gradativa.
Hoje eu endosso o coro dos fãs que disseram que Dois Irmãos foi bastante injustiçado em não receber o mesmo tratamento midiático que Soul recebeu e assino embaixo. A pandemia e o não-lançamento do longa nos cinemas também prejudicou bastante a divulgação da animação e muito disso se refletiu no resultado do Globo de Ouro, que premiou Soul no lugar de Onward e de Os Croods 2: Uma Nova Era, da DreamWorks. Na categoria Melhor Animação do Oscar 2021, Onward vai enfrentar novamente Soul, além das animações A Caminho da Lua (Netflix), a irlandesa WolfWalkers (Cartoon Saloon) e Shaun, o Carneiro: O Filme (Netflix). As apostas estão altas, mas acho difícil que Pete Docter não leve mais essa estatueta para casa.
Nota: 9
Mulan, Soul e Dois Irmãos: Uma Jornada Fantástica estão disponíveis no catálogo da Disney Plus e podem ser vistos por lá exclusivamente até a premiação máxima do cinema estado-unidense mundial.
O Blog do Rodman vai acompanhar a cerimônia do Oscar dia 25 e em breve falaremos dos grandes vencedores da noite direto do tapete vermelho…
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Mentira, claro! Estarei de pijama em frente à TV assistindo a transmissão. Ainda estamos numa pandemia e eu não fui vacinado, porra!
NAMASTE!