Há mais de um ano o mundo foi tomado de assalto por um vírus
de efeitos catastróficos que já ceifou mais de 3 milhões de vidas, e desde
então, as pessoas têm tentado sobreviver da melhor maneira possível, seja se
protegendo ao respeitar as regras sanitárias da OMS, seja negando que o bicho
seja tão feio assim.
Do começo da pandemia até o atual momento, muita coisa
mudou em nossas vidas. A paranoia aumentou com a falta de liberdade de ir e
vir, as relações humanas se tornaram menos calorosas e a velha polarização
política de esquerda contra direita acabou se transformando em uma disputa de
egos, onde o grupo que quer viver precisa brigar com o que “não está nem aí”
para quem vive ou morre. O Coronavírus nos causou mudanças profundas, nos
tornou menos humanos e o “novo normal” de uma realidade que parece muito com
ficção científica está cada vez mais enraizada no dia-a-dia.
Há quase um ano, o Blog do Rodman, com a esperança de que
tudo passaria em alguns poucos meses, publicou um post falando sobre a situação
no Brasil e no mundo naquela época. 12 meses depois, é hora de voltarmos ao
assunto e contar sobre as mudanças que ocorreram nesse período, as boas e as
más. O que aconteceu um ano depois do confinamento por conta do alastramento do
Covid-19?
O MUNDO UM ANO DEPOIS
Há um ano, noticiamos aqui, após ampla divulgação nos meios
de comunicação, que a Europa havia sido um dos continentes mais afetados pelo
surto de Covid-19 depois da Ásia, lugar que, até onde sabemos, o vírus se
originou. Os primeiros meses de 2020 foram de grande pânico para a população
europeia e vimos países como a Itália e a Espanha registrarem mais de 200 mil
casos de infectados em menos de um mês, isso porque nenhum dos governos
vigentes havia levado a sério o perigo de contaminação iminente.
Atualmente, a
Itália ocupa a oitava colocação no ranking dos países mais afetados pelo
Covid-19, tendo um total de 4,07 mil casos registrados e pelo menos 122 mil
mortes desde o início da pandemia. Segundo relatos de quem mora por lá, a
situação não é tão ruim como a de outras partes do mundo, mas o país atualmente
enfrenta um segundo lockdown — nome dado às paralisações de comércio e
circulação local — devido uma segunda onda de contaminação que atingiu a
capital romana. Por causa disso, os italianos não esperam sair dessa situação ainda alarmante
tão cedo.
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Itália na pandemia |
Já em Barcelona, relatos informam que novos casos de
contágio ainda acontecem diariamente, o que tem mantido em alerta máximo as
UTIs dos hospitais locais. Junto da Itália, a Espanha protagonizou o epicentro
da pandemia na Europa no primeiro ano e atualmente, se encontra em nono lugar no
ranking dos mais afetados, com mais de 78 mil mortes e pelo menos 3,55 mil
casos registrados. Comparado a um certo país da América do Sul — aquele que de
vez em quando rola Carnaval! —, a Espanha está vivendo quase um mar de rosas.
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A Espanha ocupa o 9º lugar no ranking da pandemia |
Um pouco diferente da vizinha de península Ibérica, Portugal
é com certeza o melhor exemplo de recuperação sistemática entre os países
europeus. O país, que em janeiro de 2021 sofreu com um recorde de casos e mortes
pela doença que colapsou o sistema de saúde local, hoje vive um
momento de estabilidade. Em muitas partes, já é possível a flexibilização das
restrições que antes impediam que as pessoas sequer saíssem às ruas e os casos
de mortes caíram vertiginosamente devido uma política pública de saneamento e
conscientização da população sobre abrir mão de certos privilégios pelo bem
maior. Hoje, Portugal conta com a imunização garantida de sua população com uma
campanha ágil e maciça de vacinação que tem ocorrido em larga escala graças a
competência de seu governo — liderado pelo presidente Marcelo Rebelo de Sousa —,
o que nos dá certa inveja de nossos coirmãos lusitanos a essa altura.
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Portugal foi o país europeu que melhor se recuperou da pandemia |
Na América do Norte, os Estados Unidos ainda lideram o
ranking dos países mais afetados pelo Covid-19 — já são quase 600 mil mortes em
decorrência da doença —, mas a situação antes nublada pela presença
conservadora de Donald Trump na Casa Branca
foi amenizada com a eleição do democrata Joe Biden. Diferente de seu antecessor,
que se negava publicamente a sequer respeitar os protocolos de segurança
estimulados pela OMS (Organização Mundial de Saúde) para a não-contaminação do
vírus, Biden iniciou sua gestão influenciando de maneira bastante pungente a
população quanto aos benefícios da vacinação.
Atualmente, mais de 105 milhões
de americanos já foram totalmente imunizados, enquanto outros 147 milhões receberam pelo menos a primeira dose da vacina — os EUA têm mais de 328
milhões de habitantes —, lembrando que o país tem à disposição a vacina em dose
única da Johnson & Johnson e a mRNA, um tipo de vacina que utiliza a
replicação de sequências de RNA, hoje, fabricadas pela alemã BioNtech — em
parceria com o laboratório Pfizer — e a Moderna, uma desenvolvedora de vacinas
situada em Massachusetts.
Biden anunciou recentemente que pretende imunizar pelo menos
70% de sua população até o feriado nacional de 4 de julho, mas para isso, vai
ter que convencer também a ala populacional mais radical que é contra seu
governo — aquela que também acredita que houve fraude nas últimas eleições — e
que, claro, é contra vacinas.
Com três vacinas à disposição e uma situação mais
confortável quanto a imunização de sua população, Biden já tem conversado com
outros países em situações mais críticas para oferecer ajuda, o que inclui o
Brasil e a Índia. Com doses extras da vacina AstraZeneca (do laboratório com
sede em Cambridge no Reino Unido), Biden planeja repassar o medicamento a
outras nações, além de ajuda com oxigênio e equipamentos clínicos de intubação.
Apesar de não ter apoiado Biden em sua campanha, o presidente brasileiro Jair
Bolsonaro já divulgou que agradeceria a gentileza do democrata caso as
negociações fossem além, o que daria um gás maior na vacinação do país tropical
abençoado por Deus que segue em ritmo lento.
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Joe Biden e sua meta até o feriado nacional de 4 de julho |
Na Ásia, a cidade chinesa de Wuhan, onde foi detectado o
primeiro caso de Coronavírus no mundo, vive hoje uma situação de calmaria e há
quase um ano o local está praticamente livre de novos casos da doença, graças a
um trabalho rígido de conscientização ao uso de máscaras protetoras, a não-aglomeração
em lugares públicos e sobretudo a vacinação. A província de 11 milhões de
habitantes foi a responsável pela maior parte das mortes na China pelo Covid-19
— foram pelo menos 4635 óbitos só na região —, mas atualmente administra bem
novas ondas, já tendo praticamente eliminado a doença de seu território. A
China hoje ocupa a 97ª posição no ranking de países afetados pela pandemia e
tem menos de 5 mil mortes em sua extensão — no Brasil, em um único dia, ocorreram 4211 mortes em abril —, o que diz muito sobre sua política
de contenção e prevenção do vírus por lá.
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5 de maio: Público assistindo aos shows do Strawberry Music Festival em Wuhan |
Totalmente na contramão no país de Xi Jinping, a Índia, que
é o segundo país mais populoso do planeta, vem vivendo desde o começo de abril
uma segunda onda de contaminação devastadora, o que tem preocupado governantes
de vários lugares da Ásia e de outros continentes. Após conseguir diminuir e
muito a curva do contágio no início do ano — a Índia chegou a registrar mais de
93 mil casos de infectados por dia em setembro de 2020 — o país começou a
enxergar com bons olhos a campanha de combate ao Covid-19, o que fez com que
seus governantes, num rompante de excesso de confiança, decidissem afrouxar as
restrições de segurança em seu território. O processo eleitoral em cinco
estados indianos pode ser iniciado sem grandes problemas na metade do mês, o
que colocou mais de 186 milhões de pessoas nas ruas para votar sem qualquer
protocolo de segurança ou distanciamento social. Além disso, o críquete —
esporte nacional mais popular — botou mais de 130 mil torcedores em
arquibancadas para assistirem duas partidas contra o time da Inglaterra,
igualmente ignorando as medidas sanitárias de praxe.
O resultado?
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Sistema de saúde colapsado na Índia |
Por conta do
clima de “já ganhou” que tomou a Índia — achando que já tinha derrotado o vírus
por nocaute —, nas primeiras semanas de abril (2021), o país registrou 270 mil novos casos de Covid-19, ocasionando mais de 1600 mortes, o que serve de
exemplo não só para a Índia, mas também para todo o restante do planeta: Não
dá para cantar vitória antes da hora com uma doença tão letal.
O mais irônico
disso tudo é que a Índia, que para não entrar em colapso depende hoje da ajuda
humanitária de países como os Estados Unidos, por exemplo, é a principal
fabricante mundial de vacinas e é de lá que são provenientes os principais
insumos para a fabricação da vacina distribuída atualmente no Brasil, em
parceria com os laboratórios da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz).
HABEMUS VACINAS
No início da pandemia, ainda em 2020, falava-se que uma
possível vacina contra o Covid-19 dificilmente seria sintetizada e aprovada em
menos de um ano, o que acabou se provando uma inverdade, para nosso alívio.
Ainda no final de janeiro do mesmo ano, a China já havia disponibilizado a sequência
genética do vírus, o que possibilitou que as comunidades científicas mundiais começassem
a trabalhar num imunizante com base nos estudos.
No mesmo mês, a empresa alemã BioNTech começou a fazer
avanços nas pesquisas de RNA, utilizando ao invés do próprio vírus inativado —
como é de costume na criação de vacinas — uma molécula desenvolvida em laboratório
para simular o material genético do SARS-Cov-2 (nome científico do Covid-19),
mas que é incapaz de causar a doença propriamente dita.
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Fonte: OMS |
Depois dos primeiros estudos em animais, testes de toxidade
e o planejamento quanto à fabricação das vacinas, a BioNTech — que já tinha um
financiamento governamental de 375 milhões de euros para a pesquisa — contou
com a parceria da farmacêutica americana Pfizer para só então avançar com a criação de uma
vacina eficaz contra o Coronavírus.
Os primeiros testes em humanos aconteceram na Alemanha já em
abril de 2020 e pouco depois nos Estados Unidos. Em julho, foram divulgados os
primeiros resultados da fase 1 de testes, contando com voluntários de vários
lugares do mundo, incluindo o Brasil.
Ao final da fase 3 de testes, foi concluído que a vacina Pfizer/BioNTech
tinha eficácia de 95% contra a doença e os dois laboratórios passaram a se
dedicar a produzir o produto em larga escala, com a intenção de imunizar cerca
de 650 milhões de pessoas em todo o mundo. O registro da vacina junto ao FDA
(Food and Drug Administration, o órgão governamental dos EUA que faz o controle
de alimentos e medicamentos) foi realizado em dezembro de 2020.
Em paralelo às pesquisas da Pfizer/BioNTech, a Rússia também
começou seus próprios estudos para a criação de uma vacina e chegou a registrar
seu imunizante em agosto de 2020, com os cientistas alegando que havia 97,6% de
eficácia em seu resultado. Apesar desse aparente sucesso e da pressa do
presidente Vladimir Putin em divulgar os avanços de seus cientistas antes de
todo mundo, a Sputnik V, como é denominada a vacina russa, não foi aprovada
pelos testes da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) no Brasil
por, segundo a própria agência, haver até o momento "ausência ou insuficiência
de dados de controle de qualidade, segurança e eficácia do produto".
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Putin e a Sputnik V |
Além das vacinas da Pfizer/BioNTech e da Sputnik V, pelo
menos mais cinco outras estão em uso por todo o mundo, incluindo a Oxford-AstraZeneca
(do Reino Unido), a Moderna (EUA), a Janssen (elaborada pela Johnson & Johnson),
a indiana Covaxin e a Coronavac, desenvolvida pelo Instituto Butantan em
parceria com o laboratório chinês Sinovac.
Na corrida das vacinas, por enquanto, apenas três dessas citadas
estão sendo aplicadas no Brasil ou em fase de testes pela Anvisa e apenas a
Sputnik V foi, até o momento, descartada para uso em solo tupiniquim. Mais de
16 milhões de brasileiros em grupos prioritários (idosos, agentes de saúde) já
foram totalmente imunizados com as duas doses das vacinas do Butantan e a AstraZeneca — a primeira pessoa vacinada no Brasil após a aprovação do uso emergencial pela Anvisa aconteceu no dia 17 de janeiro —,
o que equivale a pouco menos do que 8% da população do país.
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A enfermeira Mônica Calazans, a primeira brasileira a ser vacinada no país |
É possível
acompanhar o avanço da vacinação nacional direto pelo Google diariamente, mas
infelizmente o processo só não está sendo mais rápido como em outros países por
conta da demora das negociações entre o governo federal e os laboratórios.
Além disso, tanto o Butantan quanto a Fiocruz vêm sofrendo com os atrasos no
recebimento do denominado IFA (Insumo Farmacêutico Ativo) para a fabricação das
vacinas em território nacional, que nos dois casos são importados da China e da
Índia.
39 milhões de doses da americana Janssen devem chegar ao
Brasil até dezembro de 2021 após negociação com o governo para tentar agilizar
a imunização no país, porém, é de conhecimento público que as coisas poderiam
ter andado bem mais agilmente se o Ministério da Saúde tivesse criado um plano
de imunização nacional desde o início da pandemia. Após a fracassada tentativa
de comprar 2 milhões de doses diretamente da Índia da vacina AstraZeneca, o
governo e seus vários ministros — só nesse período de pandemia já estamos no
quarto homem à frente da pasta da saúde — patinaram na condução das negociações
com os laboratórios estrangeiros, o que acabou ocasionando nesses meses
milhares de mortes por falta de vacina. A maioria delas, com grandes chances de
serem evitadas. Hoje, o Brasil tem quase meio milhão de mortos por conta do Covid-19, um número estarrecedor.
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Quase meio milhão de CPFs cancelados: Do jeito que o Diabo gosta! |
Além da importação de todos esses imunizantes e insumos, o
Brasil trabalha nesse momento em duas vacinas próprias, o que vai garantir
maior autonomia na aplicação de medicamentos injetáveis. Tanto a Butanvac
(elaborada pelo Instituto Butantan de São Paulo) quanto a Versamune (da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo) estão em
fase de testes pela Anvisa e a previsão é de que, sendo aprovadas, comecem a
ser aplicadas a partir do segundo semestre do ano.
VARIANTE DO VÍRUS
Além dos atrasos na compra das vacinas e da demora da chegada
dos insumos para a fabricação das mesmas em nosso território, o Brasil se
viu em janeiro de 2021, também vítima de uma variante do Coronavírus,
denominada por aqui de P.1.
Descoberta em Manaus (AM), a P.1 causa um agravamento rápido
no quadro de saúde do infectado, além de atingir também pessoas mais jovens e
aumentar o tempo de internação. Segundo dados levantados pela BBC, “essa
variante do coronavírus é mais contagiosa, entre outros motivos, por causa de
mutações que facilitaram a invasão de células humanas”.
De acordo com a fonte, essa
característica mais agressiva pode causar maior letalidade, mas estudos da
Fundação Osvaldo Cruz do final de fevereiro de 2021 alegam que, apesar dos
infectados com essa variante apresentarem carga viral 10 vezes maior que sua “versão”
anterior, — ou seja, a pessoa é capaz de transmitir o vírus com mais facilidade
— isso não quer dizer que em seu organismo a doença seja mais grave.
A variante ainda vem sendo analisada, e até o presente
momento, as respostas quanto a proteção exercida pelas atuais vacinas são pouco
claras. Baseado em testes realizados nos anticorpos de 35 vacinados, o Butantan
anunciou que a Coronavac é sim capaz de neutralizar a variante P.1 e já no
Reino Unido, todos os testes realizados com a AstraZeneca, a Pfizer e a Moderna
também se mostraram eficientes contra a variante europeia da doença, denominada
por lá de B.1.1.7.
Esperamos que quanto mais pessoas vacinadas no mundo, menos
chances de serem criadas novas variantes do Covid-19 existam e que aqui no
Brasil a imunização comece em breve num ritmo mais acelerado, afinal, somos
mais de 211 milhões e quanto antes formos vacinados, melhor.
CONTINUA...
Fontes de Pesquisa: