Como já se tornou tradição no Blog do Rodman, mês de março é
para falar de Oscar, então 'bora fazer um top 10 por ordem de preferência das produções indicadas esse ano para o grande prêmio da noite, o de Melhor Filme.
And the Oscar goes to…
10 - "Belfast"
Passado no final dos anos 60 e tendo como foco principal o cotidiano de uma família comum da Irlanda, Belfast é
praticamente uma autobiografia do diretor e roteirista norte-irlandês Kenneth
Branagh, que em sua infância, viu de perto as implicações de uma verdadeira
guerra civil entre protestantes e católicos naquela mesma década.
Filmado em grande parte em preto branco e com uma fotografia
capaz de capturar com bastante precisão as nuances dos cenários de época, Belfast retrata fielmente um período conturbado da história
irlandesa — a guerra santa citada anteriormente no texto e que mais tarde, originou canções como "Sunday Bloody Sunday", do U2 —, embora esse conflito não
seja o que mais importa na trama.
Na história, acompanhamos as aventuras de um menino de 9
anos chamados apenas de “Buddy” — com o ator mirim Jude Hill representando o
próprio Branagh — vivendo num bairro de subúrbio com seu irmão mais velho, os
pais e os avós. Ele vai à escola, conhece seu primeiro amor, participa de confusões
com uma prima mais velha e se torna alvo de uma gangue perigosa que quer punir
o seu pai apenas por sua escolha religiosa.
O pai do garoto, um carpinteiro que está sempre viajando a
trabalho, é vivido pelo ator Jamie Dornan (mundialmente conhecido por seu papel de Christian Grey na série de filmes Cinquenta Tons de Cinza) e tem uma ligação importante com o personagem
principal, apesar de parecer ausente. Já a mãe (Caitriona Balfe), é obrigada a
segurar as pontas em casa com os dois filhos enquanto os conflitos armados
passam a eclodir com cada vez mais frequência na vizinhança, até então, pacata.
Se focasse no conflito entre protestantes e católicos em si , Belfast seria apenas mais um
dos tantos filmes sobre guerras civis, mas como mira na visão inocente de
uma criança em meio a um conflito violento de fundo religioso, a produção ganha
vários pontos extras por seguir por um caminho menos comum em Hollywood e mais agradável.
Indicado ao prêmio de Melhor Filme e ao de Melhor Diretor
para Keneth Branagh, Belfast também concorre a Melhor Roteiro Original, além da
estátua de Melhor Atriz Coadjuvante para a veterana Judi Dench (a “M” da série
de filmes 007), que apesar de seu talento inegável já provado tantas vezes em
outras obras, aqui, não me parece justificável a indicação, já que seu papel é
bem econômico como a vó bondosa do menino Buddy e sem grande destaques de atuação.
Belfast ainda não estreou em nenhuma plataforma de streaming
e pode ser visto apenas em alguns cinemas menos populares e em sessões de horários
duvidosos.
9 - "Amor, Sublime Amor"
Faltava um musical na incrível carreira de filmografia de
Steven Spielberg. Agora não falta mais.
Tive grande resistência em comprar a ideia de Amor, Sublime
Amor quando assisti ao trailer e só aceitei a tarefa de ver o longa quando me
impus a obrigação de, pela primeira vez na história do Oscar, gabaritar a lista
de indicados a Melhor Filme.
Eu sempre tive muita preguiça para musicais e ao longo dos meus anos de cinéfilo pipoca, deixei passar em branco vários nomes do gênero como
Moulin Rouge, Chicago e Os Miseráveis por puro preconceito.
Ok, eu fui ao cinema assistir La La Land, mas em grande
parte por conta do diretor Damien Chazelle que tinha me ganhado em Whiplash: Em
Busca da Perfeição, filme que considero o ápice da atuação de um ator — J.K. Simmons —, mas isso não terminou com a minha cisma em assistir musicais.
Falando de Amor, Sublime Amor, é difícil comparar com outros
filmes dirigidos pelo Spielberg já que nenhum deles sequer se assemelha com o
que o diretor veterano nos trouxe em 2021, por isso, a crítica só pode ser feita com base no que podemos ver ao longo das 2h36 de projeção.
O musical é outro dos exemplos desse ano que poderia ter
pelo menos uns trinta minutos a menos, já que a história de Romeu e Julieta do
casal principal passada no final dos anos 50 é bastante insossa e bem menos
interessante que a dos personagens coadjuvantes que acabam roubando a cena.
Os personagens de Ansel Elgort e Rachel Zegler não são bem
desenvolvidos e se tornam desinteressantes logo no início do longa, quando
acabam sendo ofuscados pelo casal Anita (Ariana DeBose) e Bernardo (David Alvarez),
dois porto-riquenhos radicados em Nova York que são obrigados a enfrentar toda
o preconceito da vizinhança local e que chamam todos os holofotes da história
para si com seu jeitão explosivo.
No enredo, Tony (Ansel Elgort) faz parte de uma gangue de americanos denominada “Jets” e que tem uma rixa quase que pessoal com o bando de
Bernardo, o líder dos porto-riquenhos. Ao conhecer Maria (Rachel Zegler), que é
a irmã de Bernardo, Tony acaba se apaixonando pela menina e decide colocar de
lado suas convicções para viver o seu amor, coisa que não é vista com bons olhos
por Riff (Mike Faist) o líder dos Jets.
Como toda boa encenação do clássico romântico de
Shakespeare, é claro que a história acaba em tragédia, mas até lá, nós
conseguimos desfrutar dos números musicais impressionantes filmados em plano
aberto e que mostram que, mesmo aos 75 anos, o velho Spielberg continua afiado
atrás das câmeras, provando que não há gênero no cinema que ele não possa
dominar.
Destaque para a atriz Ariana DeBose (que merecidamente está
disputando o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante) tanto por sua atuação dramática
quanto por sua expressão corporal na dança. Nunca tinha visto uma atriz se
entregar tanto a um papel de dançarina como vi em Amor, Sublime Amor. Palmas e
mais palmas. O filme vale acima de tudo pelos números musicais que ela comanda.
Amor, Sublime Amor está no catálogo do Disney +.
8 - "Duna"
Adaptado da obra escrita pelo norte-americano Frank Herbert para
uma série de livros iniciada na década de 60, a megaprodução Duna de Denis
Villeneuve é a segunda tentativa de levar a saga do jovem Paul Atreides aos
cinemas. A primeira aconteceu em 1984 e foi dirigida por David Lynch num filme
considerado por muitos como aquém à obra da qual se origina.
Parte de uma série já anunciada pelo próprio diretor antes
mesmo do primeiro filme estrear, Duna conta a história do jovem brilhante e
herdeiro de uma família real Paul (Timotheé Chalamet), considerado por muitos como um messias e que tem
como sua primeira missão viajar para um planeta arenoso hostil a fim de
garantir o futuro de seu povo, além de salvar os próprios pais.
Com ares de superprodução e um orçamento idem — US$ 165
milhões — Duna é o representante mais caro a fazer parte da lista oficial dos dez indicados
à estatueta de Melhor Filme na cerimônia do Oscar e também o que mais destoa dos
demais concorrentes por parecer mais com um blockbuster produzido para faturar
milhões nas bilheterias mundiais do que necessariamente ser algo mais artístico.
Apesar da série de livros Duna ter inspirado muitas das obras
cinematográficas que se tornaram famosas nas décadas seguintes — incluindo Star
Wars —, hoje todo o roteiro e seu lance de “o escolhido”, "jornada do herói" e “guerra espacial”
soa como uma grande cópia de centenas de outras que já estamos cansados de ver
por aí, o que causa certo desinteresse a seu enredo.
Por se tratar do começo de uma nova saga, também é bem claro
que a história do filme por si só parece não conseguir se sustentar, já que
faltam pedaços da narrativa para que seu entendimento seja completo. Além
disso, Duna é longo em excesso e se perde no ritmo em vários momentos, se tornando sonolento e chato.
A produção de cenários, vestuário e efeitos digitais, no
entanto, é um ponto indiscutível no Duna de 2021. Villeneuve não quis
economizar no quesito qualidade e o resultado ficou impressionante, mesmo para quem, à revelia do pedido do próprio diretor, não conseguiu ver a sua obra-prima na tela do cinema em IMAX. A meu ver, a junção de efeitos práticos e
cenários reais sem a muleta do chroma-key foi um dos grandes acertos da “película”
e fez jus ao que tanto alardearam sobre visual magnífico do filme.
Além de Melhor Filme — o que dificilmente deve levar —, Duna
também concorre a Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Figurino,
Melhor Trilha Sonora — para Hans Zimmer —, Melhor Som, Maquiagem e Cabelo,
Melhor Design de Produção, Melhor Edição, Melhor Fotografia e Efeitos Visuais,
categoria em que vai bater de frente com Homem-Aranha: Sem Volta para Casa e
Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis, ambas produções da Marvel/Disney.
É muito provável que Duna faça a limpa nessas categorias
mais técnicas como maquiagem, som e edição e seria o grande triunfo pessoal de Villeneuve vencer na categoria Efeitos Visuais depois de dizer que os
filmes da Marvel/Disney não passam de “cópia e cola uns dos outros”, o que
guardada as devidas proporções, não deixa de ser uma verdade incômoda.
Duna está disponível no catálogo da HBO Max, mas ninguém deve assistir pela TV a pedido de Denis Villeneuve. Se você não viu no cinema, não veja mais em lugar nenhum.
7 - "Licorice Pizza"
Até bem metade do filme, eu não tinha entendido qual era a de
Licorice Pizza ou o que o diretor e roteirista Paul Thomas Anderson estava propondo
contar com sua história, até que me dei conta que não havia nenhuma trama mais
elaborada a ser desvendada. Assim como muitas outras obras de seu extenso
currículo, o diretor norte-americano estava preocupado apenas em contar uma
história de amor passada nos anos 70 e nada mais além disso.
Com um roteiro simples, ótimas atuações de um elenco jovem e desconhecido do grande público, Licorice Pizza é o mais despretensioso dos indicados ao
prêmio de Melhor Filme do Oscar e que
exatamente por isso, talvez, se torne um forte candidato a levar a estátua.
No enredo, acompanhamos as aventuras de um ex-ator mirim menor
de idade interpretado por Cooper Hoffman que se apaixona quase à primeira vista
pela já experiente Alana Kane (Alana Haim) durante uma sessão de fotos na
escola e passa a tentar de tudo para se aproximar dela, inclusive usar de toda
a sua lábia.
Os dois se tornam parceiros de negócios e embora fique claro
ao expectador que eles se gostam, ambos acabam vivendo várias situações que
os afastam sempre que estão muito perto de concretizar o
que sentem um pelo outro.
Por ser protagonizado por dois jovens “fora do padrão de beleza hollywoodiano” — ele mais rechonchudo com uma
tremenda cara de adolescente de trinta anos e ela de nariz alongado e feição
judia —, Licorice Pizza ganha vários pontos ao nos apresentar um
relacionamento cotidiano entre duas pessoas comuns. Até os diálogos entre eles soam
bastante naturais, quase como se não tivessem sido escritos para personagens de
um filme e sim ditos por um vizinho ou um parente nosso.
A naturalidade é tão grande que personagens e atores se
mesclam. Alana Haim, a protagonista, não só compartilha o mesmo nome que a sua
personagem como também a sua família, já que o seu pai (Moti Haim) no filme e as suas irmãs
na história, são também seus familiares na vida real, o que obviamente,
contribui para o citado tom “comum” que o enredo procura passar o tempo todo.
Licorice Pizza — cujo nome eu custei a entender o
significado mesmo correndo atrás de fontes seguras — está indicado ao Oscar de
Melhor Direção e a Melhor Roteiro Original — escrito pelo próprio Paul Thomas
Anderson —, além de Melhor Filme e ainda não está disponível em nenhuma
plataforma de streaming oficial.
Se vira aí pra assistir, mané!
6 - "O Beco do Pesadelo"
Fazia algum tempo que eu não assistia a um filme dirigido
pelo mexicano Guillermo del Toro, mas com O Beco do Pesadelo, eu me surpreendi pela maneira como ele
conseguiu fugir do estigma de sempre nos apresentar histórias com elementos
fantásticos e criaturas monstruosas em seus trabalhos.
Ambientado na época pós-Primeira Guerra Mundial, o roteiro
baseado no livro Nightmare Alley de William Lindsay Greshaw conta a história do
ambicioso vigarista Stanton Carlisle (Bradley Cooper) que tem um talento nato
em manipular pessoas e que decide usar isso para fazer fortuna. Unido a uma
clarividente e seu marido mentalista após uma apresentação circense, Carlisle
encontra seu destino final quando tenta aplicar o golpe da sua vida num
poderoso magnata com a ajuda da psiquiatra dele, em cena, vivida por Cate
Blanchett.
Com uma fotografia suja, planos longos e uma duração
entediante de 2h20, o filme acaba sendo desnecessariamente arrastado e confesso
que tive que assistir como uma série em “três episódios” para não me render totalmente ao sono.
Como entretenimento, fica aquém do que esperamos
para uma história baseada em fatos, mas entrega boas atuações de Bradley Cooper
— esnobado pela academia mais uma vez —, o sempre ótimo Willem DaFoe, Rooney Mara
como a partner de apresentações mentalistas de Stanton e claro, Cate Blanchett,
que nunca decepciona.
O filme está disponível no catálogo da Star +.
5 - "Ataque dos Cães"
Dirigido pela neozelandesa Jane Campion, Ataque dos Cães ("The Power of the Dog") chega como um dos favoritos à noite do Oscar e tem fôlego extra para bater de
frente com outros dos grandes concorrentes ao prêmio de Melhor Filme, ainda
mais depois de ganhar duas das principais categorias do Globo de Ouro, a de
Melhor Filme e Melhor Direção.
Na história, um fazendeiro linha-dura interpretado por Benedict
Cumberbatch trava uma guerra de ameaças contra a nova esposa do irmão mais novo
George (o Matt Damon genérico Jesse Plemons) e decide fazer da vida da moça (interpretada por Kirsten
Dunst, a Mary Jane da trilogia Sam Raimi do Homem-Aranha) e de seu filho (Kodi Smit-McPhee, o Noturno de X-Men Apocalipse e Fênix Negra) um verdadeiro inferno.
Toda a rudeza do personagem de Cumberbatch e a sua aparente
falta de tolerância ao jeito mais sensível do garoto serve, no entanto, para
ocultar segredos antigos do fazendeiro, algo que acaba vindo à tona quando,
enfim, os dois começam a se aproximar.
Embora tenha optado por uma abordagem mais direta ao enredo
original do livro na qual a história é baseada — ocultando, por exemplo, que o
personagem Phil teria sido responsável pela morte do pai do garoto Peter —, a
direção de Ataque dos Cães é precisa em abordar o tema homossexualidade como
ele seria tratado na época em que os fatos são narrados — metade da década de
1920 — e não deixa nada subentendido a quem está assistindo com atenção.
Com uma fotografia incrível e uma direção de elenco firme,
Campion mostra que tem o filme inteiramente sob seu controle e nos presenteia
com uma história muito bem narrada e muito bem interpretada.
Apesar disso, nenhuma das indicações de premiação ao elenco parece se
justificar, já que nenhum deles se destaca necessariamente em seus papéis ou
mesmo interpreta cenas inesquecíveis, daquelas a que estamos acostumados a ver
no Oscar.
Indicado ao prêmio de Melhor Ator, Cumberbatch dificilmente deve
superar os trabalhos de Denzel Washington (indicado por A Tragédia de MacBeth)
ou Will Smith, que levou o Globo de Ouro por seu papel em King Richards: Criando
Campeãs. Já Kirsten Dunst, embora não decepcione, tem um papel muito econômico em Ataque dos Cães para
conseguir bater de frente na categoria com Ariana DeBose (Amor, Sublime Amor) ou Aunjanue
Ellis, que faz dupla com Will Smith em King Richards.
O filme tem ao todo 12 indicações ao Oscar e faz parte do
catálogo da Netflix desde 2021. Para uma noite insone, vale a conferida.
4 - "Não Olhe Para Cima"
Lançado no final de 2021 pela Netflix, Não Olhe para Cima ("Don't Look Up") do
diretor Adam McKay (de “Vice” e “A Grande Aposta”) ganhou rapidamente os
trending topics por conta da semelhança da história com a nossa realidade atual
em que a ciência é ridicularizada pelos “especialistas” de internet
e também pelos negacionistas que nos governam — com alguns deles fazendo até campanha contra vacina.
Na história, dois astrônomos medíocres — vividos pelos
astros Leonardo DiCaprio e Jennifer Lawrence — descobrem que um meteorito está
em rota de colisão com o planeta Terra e decidem alertar as pessoas que o
resultado dessa “visita inesperada” pode ser a extinção global.
De maneira inacreditável, a descoberta dos cientistas não
causa a comoção esperada na população e da presidente dos Estados
Unidos (brilhantemente interpretada pela inoxidável Meryl Streep) ao cidadão mais
comum, a vinda de um meteoro é encarada apenas como mais uma “Fake News”, gerando no máximo
alguns bons memes na internet.
A galera no Twitter no mundo real se viu conectada instantaneamente
à história, já que o filme parece retratar de maneira fiel a nossa própria
realidade durante a pandemia de Covid-19, em que lemos e ouvimos as maiores
atrocidades vindas de autoridades que tentaram com muito custo banalizar os
estudos de especialistas ligados à ciência que alertavam sobre os perigos da doença.
Com seu filme, McKay estava fazendo uma crítica ferrenha aos
Estados Unidos e ao governo estapafúrdio de Donald Trump que tinha como grande
meta levantar bandeiras como o negacionismo científico — inflando o combate a
seus opositores democratas com notícias falsas deflagradas por seus próprios
meios —, mas a carapuça serviu muito bem para quem tem vivido num país chamado
Brasil nos últimos três anos e que tem sido vítima de um governo que, assim como o Chacrinha, não está aqui para explicar e sim para confundir.
Com poucas chances de levar a estatueta de Melhor Filme por seu teor de chacota, Não
Olhe Para Cima também disputa o prêmio de Melhor Roteiro Original — escrito por
Adam McKay — e apesar de ser uma sátira excelente com nomes como Cate
Blanchett, Jonah Hill, Ron Pearlman e Timotheé Chalamet no elenco estelar, a
produção deve passar em branco na premiação.
Como dito anteriormente, Não Olhe Para Cima consta no
catálogo da Netflix.
3 - "King Richard: Criando Campeãs"
Contando a trajetória de vitórias que permeou as carreiras
das tenistas Serena e Venus Williams desde a sua infância, King Richards:
Criando Campeãs do diretor Reinaldo Marcus Green é o “filme de superação” da
lista, categoria muito comum todos os anos no Oscar.
Baseado na história real das duas irmãs que se tornaram os maiores nomes no tênis mundial de todos os tempos, o filme coloca o já
tarimbado Will Smith no papel de Richard Williams, um pai dedicado e
determinado a tornar suas duas filhas em lendas no esporte comumente praticados
por pessoas brancas.
De uma maneira muito cativante e não poupando o espectador
de nenhuma nuance ao longo da carreira das duas meninas — mesmo as negativas —, o filme retrata o personagem de Smith como um dos grandes pilares na criação das
duas máquinas de ganhar títulos que se tornaram Venus e Serena a partir dos
anos 90.
Em uma atuação sólida e nem um pouco caricata, Will Smith
prova de uma vez por todas que está pronto para fazer parte do hall da fama dos maiores
atores da sua geração e que chegou a sua vez de mostrar que ele é muito mais do
que Um Maluco no Pedaço, Hancock ou outros personagens mais farofas que ele
protagonizou ao longo da carreira.
Igualmente fantástica, ao lado de Smith em cena está Aunjanue
Ellis, atriz que interpreta Brandi, a mãe de Serena e Venus. Os dois protagonizam juntos
cenas de discussão e enfrentamento com muita tensão, do tipo que são
particularmente destacados durante a cerimônia do Oscar. Não me espantaria se ela
levasse o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante que disputa com as já citadas
Ariana DeBose e Judi Dench, o que seria até bem justo devido a sua atuação talentosa.
Destaque também para as jovens atrizes que dão vida à Venus
(Saniyya Sidney) e Serena (Demi Singleton) da infância à adolescência.
As duas
meninas entregam grandes atuações nas cenas dramáticas e provam que também dão
conta na parte física, representando com perfeição as tenistas que homenageiam.
As cenas de competição em quadra são as mais bem-executadas que já vi em um
filme sobre esporte. Em nenhum momento parece que as jogadas filmadas são coreografadas
ou soam robóticas e ensaiadinhas. É como se as garotas estivessem em uma competição de tênis de verdade e esses momentos de preciosismo técnico fazem valer o filme em toda a sua duração de 2h24
minutos.
King Richards: Criando Campeãs está disponível no HBO Max.
2 - "No Ritmo do Coração"
Eu tendo a me tornar parcial quando um filme consegue me
emocionar durante a sua execução e depois das lágrimas derrubadas, é difícil falar da produção
como um todo com um olhar mais crítico. Dito isso, ainda assim, No Ritmo do Coração é facilmente um
dos meus preferidos para levar o prêmio de Melhor Filme na noite da cerimônia
do Oscar e nada é capaz de mudar a minha opinião.
Dirigido pela praticamente estreante diretora estadunidense Sian
Heder, "CODA" (no original) é um casamento perfeito entre história bem contada,
personagens cativantes e atuações primorosas de um elenco afiadíssimo, o que faz com que as duas horas de reprodução — e com 1h51 minutos ele é um dos mais curtos da
lista aqui citada — passem suaves diante dos nossos olhos.
No enredo, a jovem Ruby (Emilia Jones) é a única pessoa que
ouve em uma família de surdos e a garota decide seguir firme o seu grande sonho
de se tornar uma cantora de renome. Dividida entre o seu amor pela música e as
suas obrigações com a empresa de pesca da família, Ruby ainda acaba se apaixonando pelo jovem Miles (Ferdia Walsh-Peelo) em sua jornada atribulada rumo ao sucesso, o que torna ainda mais difícil
as escolhas que ela terá que fazer em sua vida.
A sinopse soa de uma maneira dramática, porém, é
surpreendente como a história acaba criando diversas situações hilárias ao
longo do filme, algumas de causar gargalhadas mesmo, especialmente as
protagonizadas pelos pais de Ruby, o casal Frank (Troy Kotsur, ator surdo indicado ao Oscar de
Melhor Ator Coadjuvante) e Jackie (Marlee Matlin, atriz surda que venceu na
categoria Melhor Atriz em 1986, por seu papel em "Filhos do Silêncio").
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Daniel Durant, Marlee Matlin, Troy Kotsur e Emilia Jones |
O romance entre Ruby e Miles permeia
boa parte da trama, mas a busca da garota pelo sonho de ser cantora nos faz
torcer genuinamente por ela, além do que a cena final de sua audição para entrar na universidade de música, se
apresentando para a família em libras, é de fazer chorar.
Apesar da sua atuação primorosa contracenando tanto com os
atores “ouvintes” quanto soltando a voz de verdade ao cantar as músicas do
filme, além da sua dedicação com os sinais complicadíssimos das libras, a jovem atriz Emilia Jones não está indicada a nenhum prêmio do Oscar, mas merece uma citação, já que todo o carisma de seu personagem se dá por conta de seu talento inegável
para o drama e para o humor.
Troy Kotsur também tem páreo duro pela frente concorrendo com grandes nomes do cinema como J.K. Simmons (indicado por Apresentando os Ricardos), Jesse
Plemons (Ataque dos Cães) e o veterano Ciarán Hinds (Belfast), mas não seria
nenhuma injustiça se Kotsur acabasse sendo condecorado, uma vez que seu papel é
maravilhosamente bem conduzido ao longo de toda a história.
No Ritmo do Coração disputa também o prêmio de Melhor
Roteiro Adaptado e o filme está disponível no Amazon Prime.
1 - "Drive My Car"
No ano em que Parasita de Bong Joon-ho levou o Oscar de Melhor
Filme e Melhor Direção, um paradigma foi quebrado em Hollywood e isso tornou
possível que filmes estrangeiros também pudessem concorrer ao maior prêmio do
cinema “mundial” nos Estados Unidos.
Até aquele ano, a Academia de Cinema
costumava premiar apenas produções caseiras e raramente dava destaque a coisas feitas além das fronteiras estadunidense. Central do Brasil e Cidade de Deus
que o digam!
Em 2022, o japonês Dirija Meu Carro de Ryusuke Hamaguchi
chega com chances reais de vencer na categoria Melhor Filme e não só porque o
sul-coreano Parasita conseguiu antes dele e abriu portas, mas sim porque ele é com segurança o melhor
entre os dez indicados à categoria. Simples assim.
Contando uma história delicada sobre luto num cenário
mundialmente conhecido pelos ataques de uma das bombas atômicas que encerraram
a Segunda Guerra Mundial em 1945 — Hiroshima —, Drive My Car narra a trajetória
de um ator e diretor teatral que é convidado a reencenar uma peça de Tchécov em
que a sua esposa falecida trabalhou boa parte da vida.
Para superar todos os fantasmas deixados pela morte dolorosa
da mulher e os mistérios envolvendo o seu relacionamento conturbado, Yusuke
(Hidetoshi Nishijima) mergulha de cabeça em seu trabalho dois anos após o fato que
o abalou e isso faz com que seu destino acabe se cruzando com a motorista
particular Miura (Misaki Watari), uma jovem bastante introspectiva com um
passado de muitas perdas e de muita solidão.
Diferente de outros títulos da lista de Melhor Filme, com
quase três horas de duração, Drive My Car é tão bem dirigido, que cada minuto transcorrido na projeção acaba valendo a pena. Mesmo
em passagens longas dentro do carro — e o filme não tem esse nome “dirija meu
carro” à toa —, mostrando apenas as expressões do personagem principal ou
contemplando os cenários numa fotografia competente, ainda assim, o
filme é bem interessante, nos convidando a uma contemplação mais intimista que só mesmo uma
obra oriental poderia nos proporcionar.
Na vida real, eu tenho pavor a respostas curtas em
diálogos cotidianos de pessoas próximas e simplesmente detesto o silêncio muito
longo em conversas.
O personagem Yusuke é claramente um cara que internaliza
seus problemas e que tem dificuldades para se expor. Seus diálogos com outras
pessoas são cheios de respostas curtas e objetivas em excesso, mas essas
características são tão bem apresentadas desde o começo da história, que em
nenhum momento isso se torna um problema enquanto assistimos ao filme. Pelo
contrário. A gente entende logo de cara que é o jeito dele e por isso, o acaba
respeitando.
A sinopse do filme já fala sobre a história de luto do
personagem, mas como eu não tinha lido nada antes de assistir e só tinha visto
o trailer — que a meu ver, não diz ABSOLUTAMENTE NADA sobre o enredo —,
confesso que fui pego de surpresa quando a esposa de Yusuke, Oto (Reika Kirishima), morre
repentinamente. Com seu jeito delicado — mesmo nas cenas não-explícitas de sexo
— e a interpretação suave, Kirishima nos faz criar uma ligação com a sua
personagem desde a primeira aparição — ela literalmente abre o filme — e apesar de ela continuar presente na história até o fim — de uma
maneira muito especial —, não tem como não ficar chocado com a sua saída da
vida de Yusuke.
Aliás, é necessário um tópico especial para elogiar o elenco
feminino desse filme. Além de Reika Kirishima, o outro grande nome de Drive My
Car é o de Misaki Watari que é perfeita como a motorista Toko. É muito raro nos
identificarmos com personagens quietos em demasia com dificuldades de se expressar,
mas a simples presença da garota já causa conforto nas cenas em que aparece, além de que todo o seu plot com o passado envolvendo a mãe austera é extremamente tocante — o que acaba causando grande mudança no protagonista Yusuke.
Outra que rouba a cena mesmo não dizendo uma só palavra por
interpretar uma personagem muda, é a atriz sul-coreana Park Yoo-Rim, a Lee
Yu-Na.
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Park Yoo-Rim e Janice Chan |
No filme, ela é a esposa de um dos produtores da peça que
Yusuke está dirigindo e que ganha um dos papeis após uma apresentação contundente em
libras. Por ser coreana e não entender japonês, ela acaba sendo obrigada a
interpretar em coreano conforme o marido traduz o que ela diz por sinais aos
membros japoneses da audição, mas é num dos outros ensaios da peça — a que acontece ao ar-livre, num parque — que Lee Yu-Na acaba conquistando o coração de todos, em uma troca muito singela de atuação com a
outra atriz do elenco, a taiwanesa Sonia Yuan (Janice Chan).
Mesmo sem entender, de fato, o que a peça encenada quer dizer, é possível compreender o sentimento envolvido no texto apenas pelos gestos de Lee e Park Yoo-Rim faz tudo de um jeito tão doce que não tem como não acabar morrendo de amores pela atriz.
É difícil descrever o quão bonitas são as cenas em que Park
Yoo-Rim encarna a sua personagem muda e como é comovente a maneira como ela se
expressa em libras. Os gestos firmes e ao mesmo tempo delicados, a sua fisionomia e todo o
conjunto me deixou bastante encantado tanto pelo personagem quanto pela atriz
que a interpreta.
|
"Cada dia é muito divertido agora..." |
Aliás, a metalinguagem presente em Drive My Car é um ponto
importante a se discutir, já que estamos assistindo a atores de cinema interpretando
atores dentro de uma peça de teatro. Chega uma hora que tudo se funde e
acabamos esquecendo o que é realidade e o que é fantasia no enredo.
A representatividade está bastante presente no filme com a
atuação de atores de fora do Japão na história, diálogos em inglês, coreano e até mandarim. A incorporação das
libras é outro elemento interpretativo que ganha grande destaque no enredo de Drive My Car, algo que também é usado nos concorrentes No
Ritmo do Coração e Duna, com a personagem Jessica de Rebecca Fergusson.
Se alguém me perguntasse “Rodman, qual seu favorito ao Oscar
esse ano? ”, eu diria sem pestanejar Drive My Car por todo o conjunto da obra.
Eu não só estou torcendo para que o filme leve o prêmio de Melhor Filme como acho também muito
justo que ele supere os demais. Foi de longe a minha melhor experiência diante da tela
entre todos os dez títulos. Terminei a projeção em lágrimas e filmes de arte que
nos tocam dessa maneira tão particular devem ser melhor considerados que os
demais.
Além de Melhor Filme, a obra intimista de Ryusuke Hamaguchi disputa Melhor Direção e Melhor Filme Estrangeiro. No Brasil, infelizmente, não está disponível em nenhuma plataforma de streaming, mas vale muito a pena correr atrás, nem que por meios alternativos. Filme imperdível.
Nota 10.
NAMASTE!